Folha de S. Paulo


Contra motim da PM, governador de Minas faz turnê de entrega de carros

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O governador Fernando Pimentel (PT), à esq., em cerimônia com a polícia em Ipatinga
O governador Fernando Pimentel (PT), à esq., em cerimônia com a polícia em Ipatinga

Ao chegar atrasado, em um dia chuvoso, a uma entrega de veículos à Polícia Militar de Minas Gerais em Ipatinga (Vale do Aço), o governador Fernando Pimentel (PT) disse que preferiu se arriscar a viajar de helicóptero a faltar ao evento.

"O tempo estava muito ruim e o meu cerimonial recomendou que eu não viesse. Eu disse: 'Não, eu vou'". A viagem foi em 6 de fevereiro, dois dias após o motim da PM estourar no Espírito Santo.

Sob ameaça de revolta parecida em Minas, Pimentel passou a última semana em viagem pelo Estado para entregar cerca de 200 carros aos quartéis. Além de Ipatinga, esteve também em Governador Valadares (Vale do rio Doce), Teófilo Otoni (Vale do Mucuri), Lavras (Campo das Vertentes), Pouso Alegre (sul de Minas) e, nesta quinta (16), vai a Uberaba (Triângulo Mineiro).

Desde que chegou ao governo, em 2015, Pimentel tem tentado evitar conflitos com a corporação. Já chegou a voltar atrás de anúncios importantes, como uma medida que economizaria cerca de R$ 260 milhões dos cofres do Estado, porque interferia na previdência de policiais.

Em Ipatinga, com o comandante-geral Helbert Figueiró, ele disse que decidiu ir porque a cerimônia dizia respeito ao "fortalecimento da corporação". "É um quadro devastador [no ES] que nós não queremos ver repetido em lugar nenhum." E usou uma frase que repetiu nos dias seguintes: "Nós temos a melhor Polícia Militar do Brasil."

Em dezembro, associações que representam a polícia mineira sinalizaram a possibilidade de paralisação. Nesta semana, marcaram uma manifestação para o dia 7 de março na praça da Assembleia Legislativa.

Na terça (14), entidades e deputados definiram como reivindicações a retomada do pagamento integral no quinto dia útil e a reposição da inflação referente a 2015 e 2016, de cerca de 18%. Em calamidade financeira, Minas vem parcelando salários desde o início do ano passado. Outra reunião, com mulheres de PMs, acontece na sexta (17).

"Há o risco de um movimento paredista, não nos moldes do Espírito Santo, e sim com as associações à frente e as mulheres para dar suporte", afirma o sargento Marco Bahia, presidente da Aspra (associação dos praças e bombeiros).

Para o sargento Salvim, vice-presidente da Ascobom (associação de servidores dos bombeiros e da PM), apesar da crise financeira, "o Judiciário e o Legislativo recebem em dia". "A nossa reposição salarial é prevista em lei. O governador tinha que ter no mínimo a sensibilidade de chamar a classe e negociar."

Depois da crise instaurada no Espírito Santo, o movimento em Minas quer buscar apoio público. "Queremos que a sociedade entenda a nossa situação. Não queremos um grupo de mulheres na porta do quartel de forma desordenada", diz Salvim.

"Vamos informar a toda a população que o governador Pimentel vem descumprindo a lei. Ninguém está pleitando aumento. Estamos pedindo o que é de direito", afirma o deputado estadual Sargento Rodrigues (PDT).

Procurado, o governo de Minas diz que as medidas fazem parte de um programa de locação de veículos, anunciado em 2015, ao custo de R$ 400 milhões. "As entregas feitas neste ano não representam ações pontuais, ao contrário, a valorização da Polícia Militar é um compromisso assumido pelo governo de Minas Gerais", diz nota da administração.

Questionado sobre as reivindicações dos militares, o governo diz que não pode conceder reajustes para não ferir a Lei de Responsabilidade Fiscal.  "Cabe destacar, entretanto, que, apesar do cenário, no caso específico da Polícia Militar, a atual gestão tornou possível o pagamento de reajustes que, mesmo sem previsão no orçamento, foram concedidos em anos anteriores. A saber: 15% no vencimento básico, em abril de 2015".

LABORATÓRIO

Bahia descreve o cenário no Espírito Santo como "desastroso". "Foi um retrocesso em termos de luta de classe. De um lado, um governo intransigente que patrocinou um discurso muito difícil até para os policiais entenderem e, por outro lado, pessoas inexperientes e não credenciadas para negociar. Serviu de laboratório para a gente não errar na nossa reivindicação salarial."

O deputado federal Subtenente Gonzaga (PDT-MG) acompanhou a negociação capixaba que travou na falta de verba do governo. Questionado sobre a situação financeira de Minas, ele diz que "não dá para começar a negociar considerando só a posição do governo, é preciso partir da realidade dos policiais".


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