Folha de S. Paulo


Febre amarela mata mais macacos e já atinge espécies em extinção

Divulgação
Veterinário do zoológico de Gramado (RS) atende bugio encontrado em Nova Petrópolis com ferimentos
Veterinário do zoológico de Gramado (RS) atende bugio encontrado em Nova Petrópolis com ferimentos

O surto de febre amarela que já infectou pelo menos 101 pessoas no país até sexta (27) atinge também centenas de macacos, inclusive espécies ameaçadas de extinção.

Desde dezembro do ano passado, foram notificadas ao Ministério da Saúde mortes de 796 primatas em 276 epizootias –o nome designa doenças que atacam os animais. O registro de cada epizootia pode se referir a mais de um indivíduo.

Das 276 ocorridas, 92 tiveram confirmação de febre amarela como causa, a maior parte em Minas Gerais (68), e o restante no Espírito Santo (17) e São Paulo (7).

O número é quase o dobro do registrado em todo o período de julho de 2014 a dezembro de 2016, quando ocorreram 49 epizootias pelo vírus.

A situação real, porém, é bem mais grave do que a descrita nos registros oficiais, diz Sérgio Lucena, pesquisador da Universidade Federal do Espírito Santo que atua na identificação de primatas mortos no surto. Ele estima as mortes em milhares.

Segundo ele, em geral os óbitos notificados são apenas aqueles de macacos achados na parte mais periférica das matas. Os animais que morrem nas áreas internas não costumam ser encontrados e se decompõem naturalmente. Além disso, muitos corpos são localizados sem condições para o exame de detecção do vírus.

"A situação é muito alarmante. Trabalho há mais de 30 anos com isso e nunca imaginei que viveríamos algo parecido", afirma.

A maioria dos cadáveres achados até agora no Espírito Santo é de bugios, mas também foram encontrados sauás. As duas espécies estão na lista de animais ameaçados de extinção. Segundo Lucena, estão em investigação mortes causadas pela febre entre saguis-da-serra, macacos-prego e muriquis.

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DINÂMICA DO VÍRUS

Os macacos costumam ser os primeiros a ser infectados pelo vírus da febre amarela e, por isso, são chamado de animais-sentinela. Ou seja: alertam para a circulação do vírus em uma área.

Por isso, quando começa a morrer uma quantidade anormal de macacos, órgãos de saúde são alertados para intensificar a vacinação.

Em épocas de surto, outra ameaça a esses primatas é a desinformação. Em 2008 e 2009, macacos foram mortos em Goiás e Rio Grande do Sul por moradores que consideravam, equivocadamente, que os animais passavam a doença. Os únicos vetores da doença, porém, são os mosquitos Haemagogus e Sabethes.

Para evitar novos casos, o governo do Espírito Santo e autoridades gaúchas divulgaram alertas para esclarecer como ocorre a transmissão.

A decisão no Rio Grande do Sul foi tomada após a circulação de rumores sobre ataques, diz Soraya Ribeiro, da secretaria de Meio Ambiente da prefeitura de Porto Alegre. "É crime ambiental", avisa.

Entre as suspeitas de ataque está o caso de dois bugios achados em Nova Petrópolis (a 90 km de Porto Alegre) no último mês. Segundo o zoológico de Gramado (RS), que os acolheu, um tinha ferimentos provocados por arma de fogo e morreu. O outro está em tratamento. Para o veterinário Marcelo Cunha, os ferimentos são compatíveis com aqueles causados por objetos cortantes, como facão.

MINISTÉRIO DA SAÚDE

Em nota, o Ministério da Saúde informou ter enviado técnicos a São Paulo e Minas para auxiliar na investigação de casos humanos e de animais. Disse ainda que está capacitando profissionais "para atuar na investigação eco epidemiológica de eventos suspeitos de febre amarela."

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ENTENDA A FEBRE AMARELA

O que é a febre amarela?
Uma doença infecciosa transmitida pela picada de mosquitos infectados; não há transmissão direta de pessoa para pessoa.

Só existe um tipo?
Existem dois: silvestre e urbano. O silvestre ocorre em áreas rurais e de mata por meio de um ciclo que envolve macacos e mosquitos como o Haemagogus e o Sabethes -o homem é um hospedeiro acidental. Já no urbano, que não é registrado desde 1942 no Brasil, o homem é o único hospedeiro e a transmissão ocorre pelo Aedes aegypti.

Quais são os sintomas?
Na fase inicial, o paciente tem febre, dor de cabeça, dores no corpo, cansaço, perda de apetite, náuseas e vômitos. Já nas formas graves, podem ocorrer icterícia (coloração amarelada da pele), hemorragias e insuficiência renal. Esses três fatores, somados, podem levar à morte.

Qual é o ciclo da doença?
O período de incubação varia entre 3 e 6 dias, em média, e o vírus fica no corpo humano por no máximo 7 dias (os sintomas só aparecem de 1 a 2 dias depois).

Como me prevenir?
A vacina é a principal forma de prevenção e controle.

O que pode ter feito com que casos da doença aumentassem?
Entre os fatores está a época do ano: em geral, o período de dezembro a maio é o de maior risco de transmissão, tanto pelas chuvas quanto pela época de viagens. Um elemento que preocupa é a grande presença do Aedes aegypti no país, mosquito que pode transmitir o vírus caso ele volte à área urbana.

A vacina é 100% eficiente? É segura?
A eficácia chega a 90% e ela é bastante segura. Pode causar reações adversas, como qualquer medicamento, mas casos graves são raros. Dores no corpo, de cabeça e febre podem afetar entre 2% e 5% dos vacinados.

Quem deve se vacinar?
Pessoas que moram ou vão viajar para regiões silvestres, rurais ou de mata dentro das áreas de risco. Ela deve ser aplicada dez dias antes da viagem.

Fontes: Ministério da Saúde e OMS (Organização Mundial da Saúde)

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