Folha de S. Paulo


Bandeiras expõem guerra de facções em presídio no RN após massacre

Em cima do telhado, na parte de trás do presídio de Alcaçuz, região metropolitana de Natal, dezenas de presos se revezavam nesta segunda (16) para balançar bandeiras.

De um lado: "Fora PCCu. Queremos a paz, mas não fugimos da guerra. RN, FDN + CV", referência às facções Sindicato do Crime do Rio Grande do Norte, Família do Norte e Comando Vermelho.

De outro, a exaltação à sigla do Primeiro Comando da Capital deixa claro que ali é território desse grupo.

Um dia após a briga entre as facções criminosas que deixou ao menos 26 mortos no presídio, os detentos voltaram a se rebelar e, desta vez, expuseram a guerra do lado de fora da prisão.

Policiais admitiam a possibilidade de haver mais corpos dentro da unidade, que ainda eram procurados –inclusive na fossa do presídio.

De manhã, presos agitavam as flâmulas e gritavam: "Uh, é sindicato" (referência à facção do RN surgida por volta de 2012) e "PCC vai morrer".

O grupo criminoso com origem em São Paulo, porém, parecia estar em vantagem. Seus filiados caminhavam livremente, subiam nos telhados e conversavam com pessoas do lado de fora.

A parcela do Sindicato do Crime foi dominada pela polícia no início da tarde.

Do lado de fora, parentes gritavam também, como se formassem uma torcida de futebol. No domingo (15), familiares de ambos os lados brigaram e uma pessoa foi ferida com uma faca.

No campo de batalha que virou a cadeia de Alcaçuz, o PCC dominava apenas o pavilhão 5, uma área de segurança máxima. Até sábado, o Sindicato do Crime comandava o 1, o 2 e o 4. O pavilhão 3 era neutro, conhecido como "massa", porque não pendia para nenhum dos lados.

Segundo Guilherme Bulhões, da comissão de advogados criminalistas da OAB, o setor ocupado pelo PCC está com as celas quebradas desde 2015. Os próprios presos o quebraram e, desde então, o governo estadual não consertou. "Eles caminham livremente pelo pavilhão", disse.

Na tarde de sábado (14), os presos do PCC dominaram os agentes e tomaram o controle da sua área. Segundo os próprios detentos, que depois conversaram livremente por telefone com quem estava fora, uma sala de armas foi tomada naquele momento.

Eles então entraram no pavilhão 3 e ordenaram: quem não participasse da matança seria morto também.

O pavilhão 4, que tinha por volta de 140 pessoas ligadas ao Sindicato do Crime, foi invadido. É de lá a maioria dos mortos. Alguns conseguiram fugir para outras alas. Os homens foram mortos a tiros, depois decapitados e mutilados.

O presídio de Alcaçuz, inaugurado na década de 90, é o maior do RN. Para chegar até lá, é preciso percorrer uma estrada de terra. Ele fica numa área de dunas, a poucos minutos da turística praia do Cotovelo, na cidade de Parnamirim, divisa com Natal.

Os presos costumam cavar buracos na areia fofa das dunas para escapar. "Cuidado aí, amigo, que um pode aparecer aí no chão", disse um policial para a reportagem da Folha, que se aproximou de um dos muros do local.

No início da tarde, policiais do Choque da Polícia Militar entraram no presídio e ficaram numa espécie de pátio que separava o PCC do Sindicato do Crime para negociar uma saída pacífica.

Do lado de fora, num restaurante onde parentes aguardavam alguma solução, a dona de casa Maria, 49, (nome fictício) explicava a situação do presídio. "Os presos estão nervosos, estão com medo de serem exterminados", disse.

O filho dela, de 22 anos, está preso há três –por participação em um latrocínio. Ela só ficou sabendo que o rapaz estava vivo quando conseguiu falar com ele por telefone.

Colaborou FRANCISCO COSTA, de Natal


Endereço da página:

Links no texto: