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Pastor 'na cova dos leões', vereador eleito quer defender pauta evangélica

Marcus Leoni / Folhapress
SAO PAULO, SP, BRASIL, 11.11.16 11H Rinaldi Digilio, vereador eleito em Sao Paulo. Ele e pastor da igreja Quadrangular, uma das mais importantes igrejas pentecostais do Brasil. Seu pai, Rocco Digilio, e presidente da igreja. Rinaldi foi eleito vereador com mais de 20 mil votos.(Foto: Marcus Leoni / Folhapress, COTIDIANO)
O pastor Rinaldi Digilio (PRB), eleito vereador em São Paulo

No dia em que se tornou vereador em São Paulo, em 2 de outubro deste ano, o pastor Rinaldi Digilio, 42, ouviu um alerta de um colega sobre o que ele vai enfrentar na Câmara Municipal a partir de janeiro. "Pastor, o senhor foi jogado no meio dos leões".

O Velho Testamento conta a história de Daniel, que foi escolhido por um rei para ser um dos presidentes do reino. Invejosos, outros príncipes armaram uma emboscada a partir de uma lei: se alguém fosse flagrado rezando a Deus, seria condenado à cova dos leões. Daniel foi pego e enviado às feras.

Eleito com 21 mil votos, Rinaldi Digilio (PRB) quer fim parecido ao do personagem: a salvação dos leões. Na Bíblia, um anjo enviado por Deus segurou a boca dos felinos e Daniel foi libertado.

"Estou só há seis meses em um partido", afirmou ele por três vezes durante a entrevista. Parecia preocupado com uma possível imagem de inexperiente na política: será calouro na Câmara. "Há pessoas que estão no quinto mandato...", disse.

Ele ainda não sabe como será a convivência com os "leões", os outros 54 vereadores –três deles do PRB, ligados à Universal.

Nesta eleição, Rinaldi foi escolhido para ser o candidato da Quadrangular, uma das maiores igrejas pentecostais do Brasil, com cerca de 2 milhões de fieis. São 300 templos apenas na capital.

Nascido na Vila Prudente (zona leste), ele frequenta a Quadrangular desde bebê. Sua mãe é pastora, e seu pai, Rocco Digilio Filho, é o presidente do conselho da igreja no Estado –órgão que administra os templos em SP.

Em outras eleições, a igreja já havia tentado eleger vereadores na capital, sem sucesso. Dessa vez, Marcos Pereira, ministro da Indústria e Comércio Exterior do governo Temer, convidou Rinaldi para se candidatar pelo PRB –comandado pela Universal.

"Nunca fui político. Minha trajetória é de ajuda às pessoas, por isso consegui votos fora da Quadrangular", diz Rinaldi. Líder de juventude na igreja, ele comandou auxílios a vítimas de tragédias, como a de Mariana (MG), em 2015.

O vereador espera estar na base de apoio do prefeito eleito João Doria (PSDB), e diz que vai levar demandas evangélicas para a Câmara. Uma das ideias é tentar acelerar a regularização de templos.

"O processo é demorado. Precisa ter o alvará [de funcionamento], a vistoria dos Bombeiros. Nosso gabinete estará aberto para ajudar as igrejas nesse sentido", diz.

Há outras propostas que ele quer encabeçar, como dois novos modelos de creches: um com cursos de artesanato e informática para crianças, e outro tipo, este dedicado a receber idosos. "Essa casa ficaria com o idoso durante o dia e à tarde o filho buscaria".

COMANDOS E PROCESSOS

Sob condição de anonimato, membros da Quadrangular disseram que o reverendo Rocco Digilio Filho, pai de Rinaldi e quem bancou parte de sua campanha, comanda a igreja "com mãos de ferro".

Em 2014, sua reeleição ao conselho foi contestada na Justiça. Rocco era o único candidato e, no dia da disputa, a votação foi encerrada horas antes do previsto. O reverendo foi declarado presidente por "aclamação".

Ele foi processado, sob o argumento de que a antecipação do fim da eleição feriu o regimento interno. Depois, um dos pastores da igreja o processou por injúria. Segundo a queixa-crime, Rocco xingou o religioso em um evento.

Esse pastor pediu à Justiça para impedir que fosse expulso da igreja. Na Quadrangular, um fiel é excluído se processar algum colega.

"Rinaldi se aproveitou da máquina da igreja comandada pelo pai dele para virar vereador", disse um fiel à Folha.

O vereador eleito nega a interferência paterna e afirma que a escolha da sua candidatura foi da igreja. De acordo com ele, seu pai venceu a eleição interna porque fez uma "grande gestão" à frente do conselho.


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