Folha de S. Paulo


Doria terá que aparar arestas para destravar reformas e obras em SP

O prefeito eleito João Doria (PSDB) deve enfrentar logo no início do mandato uma cobrança do setor construtivo para evitar um congelamento de reformas e novos empreendimentos nos próximos meses na cidade de São Paulo.

O problema envolve a regulamentação de pontos da lei de zoneamento aprovada na gestão Fernando Haddad (PT) e que fixa as regras para construir em cada quarteirão da capital paulista. As negociações para ajustar essas normas continuam neste final de mandato do petista, mas a expectativa é que a maioria das pendências fique para a próxima gestão.

Diro Blasco/Folhapress
Obras de reforma e adaptação em cobertura de edifício no centro de São Paulo; regras serão desburocratizadas
Obras de reforma e adaptação em cobertura de edifício no centro de São Paulo

Entre os pontos em discussão estão a exigência de vias públicas para pedestres e de espaços abertos para a comunidade em alguns projetos. Escritórios de arquitetura argumentam que essas normas precisam ser melhor definidas para que não inviabilizem certos tipos de projeto.

"Está em jogo a questão de como lidar com a cidade real. Certas obrigações podem colocar em xeque as oportunidades de retrofit [renovação de empreendimentos antigos] e requalificação que existem", afirma Adriana Levisky, vice-presidente da AsBEA (Associação Brasileira dos Escritórios de Arquitetura).

Na quinta (10), a futura secretária de Desenvolvimento Urbano, Heloísa Proença, afirmou que fará ajustes nas regras urbanísticas que podem torná-las mais "atraentes" ao setor imobiliário.

Levisky cita entre os desajustes da lei a possibilidade de surgirem becos na malha urbana –lugares pouco agradáveis e que afastam a atratividade dos empreendimentos. Isso devido à previsão de via para pedestres em lotes com mais de 150 metros de frente e 300 metros em um lado.

"Imagine prever uma rua de pedestre em um lote comprido com frente só para uma rua. Certamente resultará em um beco estreito, que dificilmente trará benefícios para a cidade", exemplifica Levisky. A atual equipe de Desenvolvimento Urbano da prefeitura diz que a lei "é uma oportunidade para que projetistas criem vias de pedestres ativas, sem torná-las becos".

Outro exemplo que precisa de regulamentação, na visão da AsBEA, é a obrigação de fruição pública (espaços abertos para toda a comunidade, mas que será mantido pelo dono do empreendimento) em lotes acima de 10 mil m². "Há atividades incompatíveis com essa exigência", afirma Levisky, que cita os casos de hospitais e de escolas.

Pedra no Caminho

Por motivo de segurança, diz a arquiteta, não parece viável exigir uma passagem ao público em um colégio onde a maioria da população é de crianças ou jovens. O arquiteto Kazuo Nakano, professor da Faculdade Belas Artes e que participou de parte da elaboração do Plano Diretor da gestão Haddad, concorda que várias das questões abordadas pela AsBEA precisam ser regulamentadas.

Sobre a fruição pública em hospitais e escolas, por exemplo, avalia que São Paulo poderia aplicar um tipo de mecanismo usado na cidade de Nova York desde 1961. "Lá não é uma obrigação, mas uma opção. Caso o empreendedor consiga viabilizar a fruição pública em seu projeto, ganha bônus em acréscimos no potencial construtivo."

A gestão Haddad diz que essas regras podem ser resolvidas em novos projetos e, no caso de reformas, estão sendo estudadas. Sem se comprometer com prazos, afirma atuar para equacionar os problemas que precisam de regulamentação.

A arquiteta Áurea Mazzetti, coordenadora de um grupo de trabalho do CAU/SP (Conselho de Arquitetura e Urbanismo), afirma que, muitas vezes, é a interpretação da lei é que está errada. "Alguns pontos podem ser discutidos se precisam de regulamentação, mas trabalhar também com o projeto pode resolver. Se você pensar em um beco como um beco, ele vai ser", diz.

Outra situação que precisa ser equacionada, na avaliação da AsBEA, é a obrigação do proprietário de ceder 30% do terreno nos projetos feitos em áreas com mais de 20 mil m². "Por que um terreno com 21 mil m² terá que doar 6,3 mil m², enquanto um terreno de 20 mil m² vai permanecer íntegro?", questiona Levisky.

Se nesse terrenos grandes houver a intenção de construir um outro prédio do mesmo tamanho do primeiro, a redução da área pode inviabilizar um projeto, na visão dela. Para a prefeitura, as doações visam conferir melhor proporcionalidade entre os espaços públicos e privados.

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