Folha de S. Paulo


Após 40 anos em UTI, mulher faz arrecadação para viver em casa

Mudar de casa nunca é uma tarefa fácil. Para Eliana Zagui, 42, concretizar esse sonho é ainda mais complicado. Não tanto por ela viver há 40 anos no mesmo lugar, mas porque esse lugar é a UTI (Unidade de Terapia Intensiva) do Hospital das Clínicas, na zona oeste de São Paulo.

Sem os movimentos do pescoço para baixo desde os dois anos, em razão de uma poliomielite, Eliana mora no hospital porque precisa de uma série de cuidados especiais.

Cama hospitalar, enfermagem em tempo integral, sonda de aspiração traqueal, um aparelho respirador e um gerador –para que os equipamentos não sejam prejudicados por eventuais quedas de energia– são apenas alguns dos itens dessa lista.

"Não quero ser ingrata com o hospital, mas quero viver uma outra vida fora daqui, independentemente das dificuldades que existem. Tenho vontade de sair dessa redoma", conta ela à Folha.

Os desejos de Eliana depois da mudança? "Ser mais livre, poder estudar, fazer as minhas coisas, viajar mais. As regras aqui são rígidas, eu quero poder ter as minhas próprias regras", afirma. "Será como nascer de novo."

Para concretizar seu maior sonho atual, Eliana decidiu lançar na semana passada uma campanha de arrecadação, acessada pelo site sobrati.com.br. De acordo com seus cálculos, serão necessários pelo menos R$ 30 mil por ano para cobrir seus custos fora do hospital. "Minha campanha precisará ser contínua", diz.

Membro da Associação dos Pintores com a Boca e os Pés, com sede na Suíça, Eliana já teve até uma ideia para atrair mais doadores: leiloar trimestralmente quadros de sua autoria –com preços entre R$ 1.500 e R$ 5.000.

Além disso, as vendas da segunda edição de seu livro autobiográfico, "Pulmão de Aço", que será lançada em breve, também servirão para impulsionar a mudança. Até agora, ela arrecadou perto de 2% do que pretendia.

PRÓXIMO DESTINO

Eliana já escolheu seu próximo endereço: será a casa alugada de um amigo no Sumaré, bairro da zona oeste perto do hospital. "É uma casa espaçosa. Seria ideal um lugar já com as adaptações que eu preciso. Enquanto não há, tem que ser de aluguel."

Antes da mudança definitiva, ainda sem previsão de data, Eliana já visitou o local três vezes: "Se pudesse, não tinha voltado de lá", brinca.

A iniciativa de deixar sua morada por quatro décadas não a livra de receios –pelo contrário. "Ao sair, não tem volta. Se eu pedir alta, não tenho mais vínculo com o hospital", explica. "É um tiro no escuro. Mas riscos você vai correr em qualquer lugar, e eu quero tentar."


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