Folha de S. Paulo


Uber enfrenta cerco na Grande SP, e motoristas tentam driblar blitze

Motorista do Uber, Willians Roger, 44, sempre telefona ao passageiro antes de fazer uma corrida: pergunta se ele pode viajar no banco da frente e aproveita para sondar se não é só uma emboscada.

Essa é a maneira que encontrou para fugir da fiscalização municipal na região de Alphaville, em Barueri (Grande SP), onde ele trabalha.

Por lá, os motoristas do aplicativo, inclusive os que só estão de passagem com usuários da capital paulista, são alvo de um cerco da prefeitura.

Avener Prado/Folhapress
Willians Roger, 44, motorista do Uber, nas proximidades de Barueri
Willians Roger, 44, motorista do Uber, nas proximidades de Barueri

E isso não ocorre apenas em Barueri. Das 39 cidades da região metropolitana de São Paulo, em pelo menos 13 há leis específicas contra a atuação do Uber ou fiscalização contra os serviços sob a justificativa de que se trata de transporte irregular, conforme levantamento da Folha.

Na capital paulista, a regulamentação do aplicativo ocorreu em maio, dando respaldo jurídico aos motoristas.

Oficialmente, a empresa divulga sua atuação no Estado só em São Paulo, Campinas e Santos. Na prática, porém, as corridas são feitas também em cidades vizinhas, mesmo sem autorização.

Em Barueri, a Câmara aprovou uma lei em 2015 que proíbe "carros particulares cadastrados em aplicativos para transporte remunerado individual". Desde então, mais de 70 carros foram apreendidos, a maior parte em Alphaville. Os motoristas pagam também uma multa de R$ 2.184.

É lá que Willians Roger ensaia com os passageiros alguma mentira para contar caso sejam parados na blitz. "Só me pararam uma vez. As duas moças que estavam comigo disseram que eram amigas da minha esposa, que eu iria buscar logo na frente", diz ele, que esconde entre as pernas seu celular com as rotas.

Também em Alphaville, a administradora Juliana Maciel, 22, usa carros do aplicativo tanto para ir ao trabalho na região como para a capital nos finais de semana. "Uma vez, em São Paulo, quando o motorista viu que a corrida era para Barueri, jogou fora as garrafinhas de água, pediu para eu me sentar no banco da frente, e combinamos que eu diria que era sobrinha dele se alguém nos parasse."

Apesar de aprovada por unanimidade na Câmara e sancionada pelo prefeito, a administração disse nesta segunda (12) que pretende rever a lei e discutir os serviços.

Entre as cidades com mais fiscalização anti-Uber estão Osasco e Taboão da Serra. Em algumas, como Santo André e São Caetano, no ABC, Mogi das Cruzes e Cotia, os veículos também são proibidos, embora não haja até agora um cerco aos irregulares.

A prefeitura de Osasco apreendeu neste ano cerca de 200 carros ligados ao Uber.

Josimar Evilton, 29, foi parado no centro da cidade na quinta (8), minutos depois de um passageiro entrar no carro. Mentiu e escapou, apesar da desconfiança dos agentes. Mas até evita pegar cliente por lá –prefere a capital.

"Venho para cá e já quero desligar para evitar problema", diz. "Às vezes aceito para ver se tem alguém voltando para São Paulo", afirma.

Diego de Araujo, 22, é outro que evita aceitar corridas específicas de passageiros da cidade. "Perto do centro ou da prefeitura sempre tem apreensão", afirma ele.

Luiz César Cardoso, presidente do Sintaxbre, sindicato dos taxistas de Barueri, Osasco e outros municípios da região, diz que a categoria vai pressionar para manter a proibição nessas cidades. "Tem taxista de Barueri que perdeu 40%, 50% das corridas."

O Uber afirma que oferece um transporte privado "completamente legal de acordo com a Política Nacional de Mobilidade Urbana". "Reforçamos que nossos parceiros precisam ter os seus direitos constitucionais de trabalhar (exercício da livre iniciativa e liberdade do exercício profissional) preservados."

REGULAMENTAÇÃO

A maior parte dos municípios da Grande São Paulo não tem legislação específica para os serviços de aplicativos como Uber.

Em Mauá, no Grande ABC, a prefeitura vetou um projeto de lei que proibia os serviços. Azor de Albuquerque, secretário de Mobilidade Urbana da cidade, diz que a regulação tem que ser feita regionalmente e a decisão não pode ficar a cargo da prefeitura.

"As cidades têm características muito peculiares na região do ABC porque são conurbadas, como se fossem grandes bairros de uma metrópole. Por isso queremos um debate regional", afirma ele.

Os municípios do Grande ABC vão discutir a regulação ou proibição do serviço a partir desta semana no Consórcio Intermunicipal do Grande ABC, que reúne Santo André, São Bernardo do Campo, São Caetano do Sul e Diadema, entre outras cidades.

"Foi bom esse assunto ter surgido, porque estimulou a discussão da qualidade do transporte de táxis, deu uma chacoalhada e tirou esse serviço da zona de conforto", afirma.

Albuquerque ressalta que a discussão não significa necessariamente a liberação e que há uma concorrência aberta para oferecer 135 vagas de táxi, dobrando a frota de Mauá.

Em Guarulhos, a prefeitura também estuda a regulamentação do serviço, após uma liminar judicial impedir que fossem feitas apreensões –a demanda é alta no município devido ao aeroporto de Cumbica.

O Uber também opera oficialmente em Campinas e Santos, mas em nenhuma das duas os serviços são regulamentados.

Em Campinas, 168 veículos foram apreendidos neste ano por transporte irregular (não necessariamente do Uber). Em Santos, apesar de lei municipal que proíbe o serviço, um motorista recorreu à Justiça e conseguiu liminar para continuar trabalhando.


Endereço da página: