Era só colocar os olhos em uma planta que Alzira da Conceição Araújo conseguia dizer tudo sobre ela, desde o nome até suas propriedades medicinais. Os filhos nem sabiam explicar de onde vinha esse conhecimento que fazia amigos e vizinhos a procurarem sempre que tinham um incômodo. Alzira sabia indicar aquele chá que resolvia tudo.
Nascida na vila portuguesa de Ansião, ela chegou ao Brasil aos 17 anos, com a mãe e a irmã. Lembrava da confusão que foi seu registro na imigração ao desembarcar, pois ninguém conseguia definir a cor de seus olhos para preencher os documentos. O tom incomum de azul-escuro confundia os fiscais.
Reencontraram o pai que já estava no país há 14 anos e se estabeleceram no Belenzinho, zona leste de São Paulo.
Ajudando na lanchonete da família, Alzira conheceu o também português Narciso, com quem se casou em 1955.
Enquanto ele trabalhava, ela cuidava da casa e dos filhos. De personalidade forte, gostava das coisas do seu jeito, de controlar a todos. Mesmo com as crianças crescidas, aproveitava as visitas para cobrar horários e explicações sobre saídas e amigos.
Gostava de ler e ouvir rádio, mas sempre sobre notícias. Os livros de ficção e estações de música eram raras.
Falava da vida em Portugal, principalmente dos bailes em que dançava e era sempre disputada pelos rapazes, mas nunca voltou ao país, nem para visitar. Dizia que sua família e amigos estavam aqui.
Adorava Ubatuba, no litoral paulista, onde teve uma parada cardíaca no dia 28, levando-a à morte aos 83 anos. Deixa cinco filhos e seis netos.
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