Folha de S. Paulo


Em dois anos, idosos com passe livre dobram no metrô de São Paulo

Diego Padgurschi/Folhapress
SAO AULO, SP, BRASIL - 21-07-2016: Idoso na estacao Clinicas do Metro. Explosao de gratuidade par passageiros do Metro acima de 60 anos. (Diego Padgurschi /Folhapress - COD 1394) - EXCLUSIVO
Idoso na estação Clinicas do metrô de São Paulo; número de passageiros com mais de 60 anos dobrou

As viagens de passageiros idosos contemplados com o benefício da gratuidade no Metrô de São Paulo mais que dobraram em dois anos, o que ajuda a aumentar a crise financeira da companhia.

Segundo dados obtidos pela Folha via Lei de Acesso à Informação, o número que era de 25 milhões em 2013 chegou a 51 milhões no ano passado, um crescimento de 106% –isso considerando só o total de passageiros que usam o bilhete de idoso; é possível ainda andar sem pagar apresentando o documento de identidade na catraca.

Por trás desse crescimento expressivo está uma decisão da Assembleia Legislativa e do governo Alckmin (PSDB).

PASSE LIVRE - Número de idosos que não pagam por viagens de metrô em SP dobrou após lei

Pelo Estatuto do Idoso, lei federal de 2003, a gratuidade só é obrigatória nos transportes para quem tem mais de 65 anos. Na faixa etária entre 60 e 65 anos, o benefício fica a critério de Estados e municípios –a Política Nacional do Idoso considera quem tem mais de 60 anos como integrante desse grupo.

No fim de 2013, a Assembleia paulista aprovou lei que estendia a gratuidade às pessoas com mais de 60 anos nos transportes públicos estaduais (Metrô, CPTM e EMTU).

A norma foi regulamentada pelo governador em julho de 2014, mês em que a concessão do benefício disparou.

Além de não pagarem pelo transporte estadual, os maiores de 60 anos também têm gratuidade nos ônibus paulistanos e nas viagens de ônibus intermunicipais. Outros benefícios voltados para essa faixa etária são a meia-entrada em eventos culturais e prioridade na tramitação de processos judiciais.

CONTAS DO METRÔ

A expansão da política de gratuidades colocou pressão nas contas do Metrô paulista, que enfrenta crise financeira e, nesta semana, iniciou um plano de demissões voluntárias, medida que não era adotada desde 1998.

Além de ter de suportar mais usuários que não pagam a tarifa, a companhia também sofre com a redução nos repasses do governo do Estado para cobrir os custos dessas gratuidades, concedidas por critérios políticos.

Contas do Metrô, em R$ milhões - Apesar do aumento de usuários, gestão Alckmin diminuiu repasses para cobrir gratuidades em 2015

Estão contemplados por gratuidades no Metrô os maiores de 60 anos, estudantes (com desconto de 50% ou 100%), desempregados e deficientes, além de policiais militares, guardas metropolitanos e oficiais de Justiça.

As verbas relativas às viagens desses grupos são o único apoio estatal que o Metrô recebe, diferentemente da CPTM, que depende do Estado para manter operações.

Sem receber integralmente esses recursos, a exemplo do que ocorreu no ano passado, a empresa é forçada a abrir mão de investimentos e a cortar custos operacionais.

Para Rogério Belda, membro do conselho diretor da ANTP (Associação Nacional de Transportes Públicos), "os políticos não sabem como funciona a gratuidade. Esse grupo de pessoas com mais de 60 anos só vai crescer. O Estado não olha para o lado econômico dessa decisão". No âmbito federal, por exemplo, existe discussão para definir uma idade mínima para a aposentadoria.

Belda, favorável à gratuidade, diz que é preciso ter previsão orçamentária para a fiscalização do benefício: "Sem fiscalização, vira uma festa. O fato de ser gratuito leva até mesmo a excesso de uso".

Já os usuários contemplados pelo benefício têm opinião diferente. "Não considero um prejuízo para o Metrô. Acho o máximo o idoso ter esse privilégio. Trabalhei a vida inteira, contribuí e agora usufruo. Acho uma delícia andar, andar e não pagar nada", afirma Katia Antunes, 70, professora aposentada.

BILHETE ESPECIAL

O aposentado Sergio Sadoiana, 67, demorou mais de dois anos até decidir fazer seu bilhete especial de idoso em um posto de atendimento na estação Marechal Deodoro do metrô, na região central da cidade de São Paulo.

"Antes só apresentava o RG na catraca e era liberado, mas um agente do metrô me disse que, dessa forma [bilhete especial], vai ser mais fácil."

A depender do avanço de planos do governo, em breve fazer o cadastro para o bilhete do idoso pode não ser apenas uma questão de comodidade –mas uma condição para usufruir desse benefício.

Segundo a Folha apurou, a gestão Geraldo Alckmin (PSDB) estuda questionar judicialmente a obrigação de liberar a entrada de idosos que só apresentem seu documento nas catracas do metrô. O assunto já foi levado à Procuradoria-Geral do Estado.

Conceder o benefício somente a portadores de bilhete seria uma maneira de fiscalizar melhor seu uso –e, ao mesmo tempo, reduzi-lo.

Rogério Belda conta que frequentemente as catracas do metrô lhe são franqueadas mesmo sem que seus documentos sejam de fato checados por funcionários da companhia.

De 2013 para 2015, houve um crescimento de 25% no número de gratuidades classificadas pelo Metrô sob a denominação "passe livre", que inclui policiais militares, guardas metropolitanos, oficiais de Justiça e idosos que não possuem bilhete especial mas comprovam direito ao benefício apresentando documento na catraca.

As gratuidades dessa categoria saltaram de 13,5 milhões de passageiros em 2013 para 16,9 milhões no ano passado –e, tal como nos bilhetes dos idosos, também mudaram de patamar após a aprovação da legislação estadual que reduziu a idade para concessão do benefício.

Enquanto Sadoiana demorou dois anos, Neuza Rodrigues preferiu ser rápida. Tão logo completou 60 anos, no início do mês, decidiu se dirigir ao posto de atendimento para confeccionar seu bilhete de idoso. "É uma alegria. Agora posso ir ao médico, a qualquer lugar, e não preciso pagar. É muito importante."

Moradora de Francisco Morato, município da região metropolitana, Neuza precisa pegar ônibus, trem e metrô para chegar a compromissos no centro de São Paulo.


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