De um lado, gestantes que condenam qualquer pressão ou interferência externa no tipo de parto de seus filhos. De outro, as que referendam a tese de que há uma cultura da cesárea –ou, ainda que não façam questão do parto normal, que rejeitam a antecipação do nascimento.
A discussão já é parte da rotina de grávidas com amigos, parentes e até desconhecidos antes mesmo de chegar a consultórios médicos. Agora, ficou ainda mais acirrada.
Eduardo Anizelli/Folhapress | ||
Maria Jaqueline Chezine, 37, que está com 25 semanas de gravidez e diz concordar com a nova regra |
"Acho um absurdo limitar, a pessoa tem que poder escolher qual tipo de parto", diz a bancária Priscilla Teixeira, 36, que decidiu esperar 39 semanas para fazer sua cesárea, mas para quem a gestante deve ter a opção de antecipar.
Pelas novas regras previstas em resolução do CFM (Conselho Federal de Medicina), divulgada nesta segunda (20), os médicos só poderão realizar cesáreas eletivas, a pedido da gestante, a partir da 39ª semana, momento em que estudos apontam que há menos riscos ao bebê.
Cesárea |
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Veja o que muda com a resolução do CFM |
Cesárea a pedido só a partir da 39ª semana |
Nova regra acirra debate entre gestantes |
Especialistas se dividem sobre norma |
Leia perguntas e respostas |
Para Denise Alencar, 37, a medida está correta. Ela decidiu marcar a cesárea por ter outra filha pequena. "Não sei se iria ser traumatizante para ela que eu saísse correndo no meio da madrugada. Então marquei a cesárea, mas segurei até 39 semanas. Acho que não é saudável para um bebê sair antes, ele tem que vir na hora que quiser", diz.
Mulheres na reta final da gestação se mostravam apreensivas e temerosas nesta segunda sobre a possibilidade de a decisão do CFM interferir em seus partos. A vendedora Priscilla Barbosa da Silva, 39, considerava não haver necessidade de esperar até a 39ª semana.
"Não acho legal essa medida, porque é muito cansativo esperar. Depois de 37 semanas já dá", defendia ela, que está com 38 semanas e que tinha cesárea marcada ainda para esta segunda-feira.
A professora Tatiana Vitale, 33, é defensora da espera. "Quero parto normal, acho que não tem necessidade de antecipar", afirmou à Folha.
A bancária Gisele Bevilaqua, 26, teve seu primeiro filho de parto normal, no pronto-socorro. No caso do segundo, ficou preocupada de ficar esperando para ser atendida e preferiu marcar cesárea.
Com 38 semanas e meia, ela teria seu bebê nesta segunda-feira. Mesmo assim, acredita que a mudança da regra é importante. "Acho interessante esperar. Minha médica disse que já podia ter com 38 semanas, e eu resolvi aguardar mais um pouco."
Maria Jaqueline Chezine, 37, é enfermeira e trabalha com pediatria e UTI neonatal. Com 25 semanas, ela dizia concordar com a nova diretriz. "Já vi muito bebê de 38 semanas ter que ir para a UTI, porque não estava maduro o suficiente. Eu queria ter parto normal, mas tenho problema na coluna e não posso."
Chezine vai esperar até a 39ª semana para fazer seu parto. "Tenho amiga marcando eletiva com 38 semanas para nem entrar em trabalho de parto, com medo da dor."
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O que muda com as novas regras do Conselho Federal de Medicina?
As regras determinam que os médicos podem realizar cesáreas eletivas –ou seja, agendadas– a pedido da gestante. O procedimento, porém, só pode ocorrer a partir da 39ª semana de gestação, com dados registrados em prontuário
Por que o conselho definiu o período de 39 semanas como limite mínimo?
Para o conselho, que se baseou em um estudo do Colégio Americano de Obstetras e Ginecologistas, esse é o período em que se inicia a gestação a termo, ou seja, quando o bebê já seria considerado mais maduro. Em alguns casos, também há dificuldade em se estabelecer a semana exata de gravidez, o que diminuiria os riscos de ter um parto prematuro
Quais os riscos para o bebê que nasce antes da 39ª semana?
Bebês que nascem antes do tempo estão mais suscetíveis a problemas respiratórios, além de dificuldades para manter a temperatura do corpo e se alimentar; a fase também é importante para completar o desenvolvimento do cérebro, pulmões e fígado
E se o bebê tiver alguma complicação ou a gestante entrar em trabalho de parto antes desse período?
As regras valem apenas para os casos de cesáreas agendadas e feitas a pedido da gestante. Nos casos em que houver a indicação médica, ou que a gestante optar pelo parto normal ao fim da gestação, não há mudanças previstas
Em que situações o parto por cesariana é recomendado?
Quando a gestante tiver complicações de saúde, como diabetes, ou se houver risco para o bebê (casos em que está sentado, por exemplo)
Como garantir que a cesárea foi opção da gestante e não do médico?
A resolução estabelece que, nos casos em que a gestante optar pela cesárea, ela deve assinar um termo de consentimento em que afirma ter sido informada das opções possíveis para o parto e estar ciente dos riscos do procedimento cirúrgico. Para o Ministério da Saúde a a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), que lançaram em 2015 medidas para estímulo do parto normal, a realização de cesáreas "desnecessárias", sem indicação médica, aumenta o risco de problemas para a saúde do bebê e da mãe
E se o médico não concordar com a decisão da gestante?
A resolução do CFM prevê que, "se houver discordância entre a decisão médica e a vontade da gestante, o médico poderá alegar o seu direito de autonomia profissional e, nesses casos, referenciar a gestante a outro profissional"
Mas cesáreas feitas a pedido da gestante já não eram permitidas pelo conselho?
Embora resoluções anteriores já afirmassem que o médico precisa respeitar a autonomia do paciente, não havia uma regra específica para os casos de cesáreas feitas a pedido da gestante. Segundo Juvenal Andrade, da Febrasgo, havia um dilema ético sobre a questão, o que faz com que o novo texto que dê maior proteção ao médico
Haverá uma fiscalização dessas regras?
O conselho diz que a medida deve ser incluída na rotina das equipes de fiscalização do conselho, por meio da análise de prontuários nas maternidades
O que ocorre com o médico que não cumprir a resolução, como o prazo mínimo de 39 semanas?
Em caso de descumprimento, o caso deve ser analisado pelo CFM, que pode aplicar sanções que vão desde advertência até a suspensão do registro profissional, necessário para a prática médica. As medidas variam conforme a gravidade do caso
As regras podem estimular um maior número de cesáreas a pedido?
Para Juvenal Andrade, da Febrasgo, não há essa possibilidade. Para movimentos de defesa dos direitos da mulheres como o Artemis, no entanto, a medida deixa de incluir os médicos na discussão sobre a necessidade de reduzir a alta taxa de cesáreas no país, que chega a 85% dos partos nos planos de saúde. A taxa máxima recomendada pela OMS (Organização Mundial da Saúde) é de 15%.
Fonte: Conselho Federal de Medicina