Folha de S. Paulo


Lojista pega empréstimo, compra alimentos e perde tudo na enchente

Literalmente ou não, a comerciante Rose Souza, 49, ainda está na lama. A água da enchente de sexta (11) na Grande SP levou sua lanchonete e único ganha-pão. No total, 25 pessoas morreram. em decorrência das chuvas –o último corpo foi encontrado na madrugada desta segunda-feira (14).

Três dias após a chuva, Rose ainda tirava a lama da lojinha na beira de uma estrada de Caieiras. A água só abaixou no domingo. "No ano passado, o governo pediu para economizarmos água", conta. "Depois, apertaram um botão e despejaram essa água toda na nossa cabeça. Nem se deram o trabalho de avisar", diz.

Na noite da chuva, a Sabesp, companhia de saneamento de SP, abriu as comportas de uma represa do sistema Cantareira que subiu de 35% para 99% da capacidade. A Sabesp diz que avisou a Defesa Civil de madrugada e "evitou uma tragédia, pois a barragem corria risco de se romper. Parte da água do reservatório inundou o jardim São Francisco, que fica numa espécie de vale em Caieiras.

Tragédia por tragédia, Rose lamenta a sua. Naquele dia, havia obtido empréstimo de R$ 5.000 no Banco do Povo para abastecer a despensa do restaurante, única fonte de renda da família. Comprou bebida, carne, frango e outros itens. A água levou tudo.

Represa Paiva Castro

Naquele dia, havia conseguido um empréstimo de R$ 5.000 no Banco do Povo para reabastecer a despensa do restaurante, única fonte de renda da família.

Com o empréstimo, comprou ingredientes, carnes, frango e bebidas. Tudo isso a água também levou.

"No ano passado, o governo pediu para economizarmos água", conta. "Depois, apertaram um botão e despejaram essa água toda na nossa cabeça. Nem se deram o trabalho de avisar. Daria tempo de salvar minha lanchonete. Perdi tudo", diz.

Sem quase nada ficou a loja de Richele Coutinho, 30. O estabelecimento, que constrói calhas, virou um aquário de água barrenta. A água chegou ao segundo andar e estragou computadores, máquinas, ferramentas e quatro carros. Prejuízo: R$ 100 mil.

"As enchentes aqui são normais. Não do jeito que foi dessa vez. Poderiam ter avisado com uma sirene. Em poucos minutos eu conseguiria salvar muita coisa". No bairro, o velódromo também foi atingido: algumas bicicletas ficaram embaixo d'água e estragaram, segundo funcionários que limpavam o local.

Perto dali, um galpão da prefeitura virou um piscinão. No sábado, ele seria usado para uma formatura de estudantes do município. "Estava todo enfeitado. Perdemos a decoração, comida, freezers, mesas, computadores, tudo", lamenta Miguel Chavez, 43, gerente da empresa de que organizava o evento, cancelado.

'PISANDO NO AR'

Na vizinha Franco da Rocha, o cenário não era diferente. Gilberto Andrade, 37, trabalhava para recuperar a Chevrolet Ipanema 1991 que ele e o irmão utilizam. "Estamos pagando [o carro] ainda", disse ele, que vive de bicos e usa o veículo para levar ferramentas. "O motor está cheio de água. Os bancos eu deixei secando no sol."

O vigilante Dario Ortiz, 45, perdeu quase tudo em casa: móveis, colchões, eletrodomésticos. Também está tentando salvar o carro. A Câmara da cidade teve uma segunda atípica. Uma força-tarefa foi organizada para limpar o lugar. Na entrada, impressoras, microondas, dois fogões, extintores de incêndio e muito papel. Tudo perdido. Documentos foram colocados no sol para secar.

No hospital Professor André Teixeira Lima, que atende presidiários, o prejuízo também foi grande. Na sexta, os 620 pacientes foram transferidos para outros locais antes de serem abertas as comportas da represa. O, o local foi inundado até o telhado.

A escola Benedito Fagundes Marques também recebeu um mutirão de voluntários para tirar a água e a lama das salas de aula. A escola perdeu apostilas, documentos, histórico de alunos, só restaram os computadores. As aulas só voltam na quarta. Outras duas escolas da cidade ainda não têm previsão de reabrir as portas.

A tragédia vista do alto

Nível de chuva por cidade - das 16h do dia 10 às 16h do dia 11 de março


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