Folha de S. Paulo


Suspeita de zika ou dengue atinge 60% de população de cidade no Ceará

As 12 escolas da pequena Potengi (a 515 km de Fortaleza), no sertão do Cariri, no Ceará, estão fechadas. A unidade de saúde, que recebia em média 20 pacientes por dia, agora atende 280. E até o prefeito ficou quase dez dias em casa, de cama.

Cerca de 60% dos 11 mil moradores da cidade, segundo a prefeitura, estão ou estiveram com suspeita de dengue ou zika no último mês.

Nem os médicos escaparam. Dos cinco que prestam serviços ao município, três já ficaram doentes.

Com tantos casos, as filas para o atendimento são uma constante. "A gente chega todo dolorido, com febre, vomitando, e ainda passa quase uma hora para o médico consultar. É muito sofrimento", reclamou a dona de casa Maria do Rosário Viana.

"Em casa não tem ninguém bom. Aqui em Potengi a coisa é feia. Na minha rua, quase todo mundo está doente."

A universitária Ronise Alves Feitosa, internada na terça (1º) na unidade de saúde, critica o combate ao mosquito transmissor das doenças. "Só agora que o povo está doente é que começaram o fumacê. Nem o pessoal das endemias vinha verificar a existência de focos do mosquito."

AULAS SUSPENSAS

Na área da educação, 67% dos profissionais foram infectados, e, por isso, a secretária municipal Elayne Cristina Guedes suspendeu as aulas de cerca de 2.000 alunos por uma semana, até segunda (7).

Só nesta quinta (3), o prefeito de Potengi, Samuel Carlos Tenório Alves de Alencar (PC do B), que passou dez dias afastado com sintomas de dengue, assinou um plano emergencial, que inclui colocação de tela de nylon em todas as caixas-d'água do município, campanha educativa e contratação de veículos para pulverização de inseticida.

Segundo o secretário municipal de Saúde, Raimundo Rivaldo Rodrigues Feitosa, são aguardados os resultados de 300 exames sorológicos que foram encaminhados ao Laboratório Central (Lacen) de Juazeiro do Norte.

"Há, oficialmente, 12 casos confirmados de dengue e um caso confirmado de zika em Potengi. Porém, todos os pacientes que estão sendo atendidos pelo setor da saúde apresentam os sintomas."

"O Ministério da Saúde não autoriza a realização de exames sorológicos para confirmação do vírus da zika. Cada exame custa, em média, R$ 600. O município não possui recurso para custear essa despesa", disse Feitosa.

Segundo ele, a epidemia pode ter sido ocasionada pelo atraso no repasse do larvicida que combate o desenvolvimento do mosquito transmissor Aedes aegypti.

"O produto foi repassado pelo Estado com 45 dias de atraso. Os agentes de endemias não possuíam material para o combate ao mosquito", disse o secretário.

Procurada, a Secretaria de Saúde do Ceará (Sesa) informou, por e-mail, que o fornecimento de larvicida é atribuição do Ministério da Saúde e que, de agosto a outubro de 2015, o abastecimento não foi regular, segundo o ministério, devido a problemas no processo de aquisição. A Sesa diz ainda que, em novembro, o problema foi sanado.

Para Artur Timerman, presidente da Sociedade Brasileira de Dengue e Arboviroses, o impacto do larvicida na dinâmica da epidemia é sobrevalorizado no país.

"Não considero plausível nem provável culpar o larvicida, é a menor das possibilidades. Será que é dengue mesmo? Não pode ser zika ou chikungunya? O trabalho foi feito corretamente? É preciso responder tudo isso antes de apontar o impacto do larvicida", diz o infectologista.

Colaborou MARCELO TOLEDO


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