Folha de S. Paulo


Tragédia em Mariana põe em risco financiamento do BNDES à Samarco

Cláusulas de um contrato de financiamento de R$ 201 milhões assinado em 2014 pelo BNDES e a Samarco impedem que o banco libere o crédito à mineradora devido à tragédia ocorrida em Mariana (MG), em 5 de novembro.

O documento previa o desembolso, até outubro deste ano, de R$ 200 milhões para a empresa adquirir um forno utilizado no processo de transformação de polpa de minério de ferro em pelotas.

Pelo acordo, o R$ 1 milhão restante deveria ser destinado a "investimentos sociais".

Embora nenhuma quantia tivesse sido liberada ainda, o aparelho industrial já havia sido instalado e operava na unidade de Anchieta (ES). O crédito seria usado na compra de equipamentos para o forno, segundo a Samarco.

Mas o contrato, ao qual a Folha teve acesso, condiciona a liberação de cada parcela à "inexistência de qualquer fato que, a critério do BNDES, venha a alterar substancialmente a situação econômico-financeira da beneficiária".

A mineradora interrompeu seu funcionamento em novembro, após a barragem de Fundão ruir em Mariana, deixando ao menos 17 mortos. Não há previsão para que a empresa volte a funcionar.

Ela também teve suas atividades embargadas pela Secretaria de Meio Ambiente de Minas Gerais, que ainda a multou em R$ 112 milhões. Há uma outra multa, no valor de R$ 250 milhões, do Ibama.

A Samarco também responde a uma ação movida pela União e pelos Estados de Minas Gerais e Espírito Santo que pede a criação de um fundo de R$ 20 bilhões para a recuperação do rio Doce.

Segundo o contrato com o BNDES, a mineradora deveria começar em dezembro a quitar o financiamento, que seria pago em sete anos.

O BNDESPar, braço de participação do BNDES em empresas, possui 5,2% do capital total da Vale, coacionista da Samarco ao lado da anglo-australiana BHP Billiton.

O banco diz que a suspensão do acordo está em análise e que o crédito não havia sido solicitado pela empresa.

A Samarco afirma, em nota, que ainda estuda se utilizará o financiamento.

Para o professor titular de direito da FGV Carlos Ari Sundfeld, é "razoável que o BNDES reavalie a contratação", pois a tragédia em Mariana tem "dimensão suficiente para afetar substancialmente a situação econômico-financeira da empresa".

"Em princípio, o BNDES até poderia confirmar [o contrato], mas quando a situação começa a se embananar, os bancos são muito cautelosos, ainda mais nessa fase [em que ainda não houve liberação de crédito]", afirma.
Para o contrato ser mantido, segundo o professor, o banco deve exigir novas garantias, como uma fiança.

A compra do forno era parte do projeto, concluído em 2014, de expansão da empresa, que aumentou sua capacidade produtiva em 37%. Foram investidos R$ 6,4 bilhões no projeto. Em 2014, a mineradora produziu 25 milhões de toneladas de pelotas, 15,4% a mais do que em 2013.


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