Folha de S. Paulo


Lama de Minas deve atingir área de 9 km de mar no Espírito Santo

A enxurrada de lama da barragem rompida em Mariana (MG) deverá atingir uma área de 9 km de mar ao longo do litoral do Espírito Santo. E, embora os impactos no oceano devam ser menos drásticos do que no vale do rio Doce, eles poderão ser duradouros e afetar, por muitos anos, a presença de algas, moluscos, crustáceos e peixes.

O cenário foi traçado por pesquisadores como Paulo Rosman, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), que fez um modelo matemático já citado como referência pelo governo federal.

Ele minimiza a possibilidade de impactos significativos na região de Abrolhos –bancos de corais a 210 km da foz do rio Doce, na Bahia, que são ricos em vida marinha, atraindo até baleias.

Mas, segundo a ministra Izabella Teixeira, titular da pasta de Meio Ambiente, "que terá impacto lá, terá". "Só vamos avaliar tudo depois que acabar", afirmou.

Pelas simulações, haverá uma dispersão da lama de 3 km em direção ao norte da costa e de 6 km ao sul.

O rompimento no último dia 5 da barragem da mineradora Samarco, controlada pela Vale e pela anglo-australiana BHP Billiton, provocou um "tsunami de lama" que já chegou ao Espírito Santo e deixou 12 desaparecidos e sete mortos –além de quatro corpos ainda não identificados.

Cidades mineiras e capixabas tiveram seu abastecimento de água comprometido –como Colatina (ES), a mais de 400 km da barragem.

Nesta quinta (19), a Justiça Federal determinou que a mineradora impeça a chegada da lama ao mar, sob pena de multa diária de R$ 10 milhões.

A Samarco afirma que está estudando a decisão. Para barrar a lama, seria necessário fazer barreiras físicas para desviar os rejeitos do rio –operação considerada complexa por especialistas.

Infográfico: Caminho da lama

De acordo com monitoramento feito pelo Serviço Geológico do Brasil ao longo do rio Doce, a lama só deve chegar ao oceano na próxima semana. No domingo, a massa de argila e silte, sedimentos com grãos muito finos, deve alcançar Linhares (ES), a última cidade antes do mar.

"A lama deve chegar apenas como uma água barrenta ao oceano", disse Paulo Rosman, da UFRJ, especialista em oceanografia costeira.

DESASTRE

A ministra Izabella Teixeira diz que a reconstrução da bacia do rio Doce "não será trivial". "No mínimo levará dez anos, com muita generosidade da natureza. Você explodiu toda a cadeia alimentar do rio, inclusive de fauna terrestre, porque muito dessa fauna depende do rio."

Uma força-tarefa formada por operários, voluntários e pescadores estava trabalhando na foz do rio Doce, em Linhares, para tentar impedir a ida da lama ao mar. Barreiras flutuantes, semelhantes às usadas para contenção de vazamentos de óleo, estavam sendo espalhadas pelo local. A medida, porém, não é suficiente para impedir que os detritos cheguem ao oceano.

O biólogo André Ruschi, diretor da Estação de Biologia Marinha Ruschi, em Santa Cruz, próximo à foz do Doce, é um dos que afirmam que a lama, ao chegar ao mar, terá impactos no ambiente por muito tempo. A cadeia de montanhas submarinas que começa no foz do Doce e se estende por mais de 1.200 km é um dos maiores pontos de biodiversidade do Atlântico.

"Aqui há muita vida por causa dessa cadeia de montanhas, que interfere nas correntes e retém os nutrientes arrastados pelos rios."

Segundo Ruschi, "serão necessários até 300 anos para nos livrarmos das consequências desse crime".

Infográfico: Bacia do rio Doce


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