Folha de S. Paulo


Empresas aéreas atuam no Congresso para reduzir direitos de passageiros

O setor aéreo atua no Congresso para reduzir a assistência aos passageiros quando voos atrasam ou são cancelados e também para limitar indenizações quando, por exemplo, a bagagem é extraviada.

A discussão ocorre em comissão do Senado formada por especialistas em aviação que trata da reforma do Código Brasileiro de Aeronáutica.

A conclusão do texto, entre o final deste ano e o início de 2016, será transformada em anteprojeto de lei para, em seguida, ser analisada e votada pelos senadores.

Em reunião no mês passado, um dos membros da comissão propôs que as companhias aéreas não fossem obrigadas a prestar assistência quando o voo atrasa ou é cancelado por razões que fogem ao controle delas.

ATRASOS EM VOOS

Desde 2010, resolução da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) determina que a assistência é obrigatória sob qualquer circunstância nos atrasos ou cancelamentos.

O autor da proposta, o advogado Ricardo Bernardi, é especialista em direito aeronáutico e atua para empresas aéreas em ações judiciais. Também integrantes da comissão, a Abear (associação que representa TAM, Gol, Azul e Avianca) e a Iata (que representa as aéreas no mundo) apoiam a medida. (veja nota na íntegra abaixo)

Um exemplo mencionado pelo advogado se dá quando um aeroporto fecha por mau tempo. Na proposta, Bernardi incluiu ainda a opção de a assistência não ser obrigatória em caso de quebra.

RISCO DO NEGÓCIO

A premissa atual é que qualquer complicação na viagem faz parte do chamado "risco do negócio", entendimento incorporado do Código de Defesa do Consumidor. Bernardi diz que a ideia é aproximar a norma do que ocorre nos EUA, país que mais transporta passageiros.

Lá, quando um voo é cancelado por nevasca ou outro fator climático, o passageiro não tem direito à assistência da companhia aérea. Por aqui, a lei mais dura veio depois do episódio conhecido como "caos aéreo", no final de 2006, em que milhares de passageiros ficaram presos nos aeroportos depois de uma greve de controladores de tráfego aéreo.

A Anac, que está na comissão, diz ver a medida com cautela. "Não houve tempo de analisá-la integralmente e avaliar os possíveis efeitos." Entidades de defesa do consumidor são contra, mas nenhuma delas está nessa comissão do Senado.

Membro da comissão pela associação que representa TAM, Gol, Azul e Avianca, Geraldo Vieira sugeriu que as indenizações aos passageiros sejam balizadas por convenção internacional da qual o Brasil é signatário, em vez de levar-se em conta o Código de Defesa do Consumidor.

A convenção limita o teto das indenizações. O caso está também em discussão no Supremo Tribunal Federal, ainda sem decisão final.

As propostas enviadas à comissão serão analisadas pela relatora da comissão, a jurista Maria Helena Rolim, e depois submetida à votação entre os 28 membros –a maioria simples vence. Procurada, ela não quis falar sobre essas propostas.

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NOTA DA ABEAR NA ÍNTEGRA:

A aviação, como atividade global, aproxima cidades, países e realidades absolutamente diferentes entre si. Paradoxalmente, para que isso ocorra, ela precisa seguir parâmetros semelhantes em todo o mundo. Esses parâmetros estão muito bem estabelecidos sob o ponto de vista operacional e de segurança. Mas nem tanto sob o enfoque de custos, direitos e deveres das partes envolvidas. Isso é especialmente verdade no Brasil, onde existem regulações diferentes.

Ao longo de pouco mais de uma década o país viu ser construída uma aviação democrática que se tornou transporte de massa. Nesse processo, a maior parte da modernização e inovação tecnológica necessárias foi introduzida pelas companhias aéreas. Oferecemos um produto absolutamente em linha com o resto do mundo em segurança e qualidade operacional, incluindo pontualidade, regularidade e cuidados com as bagagens, por exemplo. Com todos os avanços introduzidos, passamos também a poder praticar preços médios acessíveis e compatíveis com o restante do mundo.

Na contramão dessa evolução, a sucessão de regulações exclusivamente brasileiras só nos afasta de ter uma aviação cada vez mais global. Frequentemente anunciadas como vantagens para a sociedade, criam situações ímpares, injustas e que só acarretam em elevação de custos para aqueles que se dispõe a exercer uma atividade produtiva. No longo prazo, comprometem o desenvolvimento, limitam a eficiência e impedem o oferecimento de preços ainda mais baixos, restringindo o número de passageiros.

É preciso mudar esse quadro. E isso não se trata de defender interesses exclusivos das companhias aéreas, mas de agir pelo estabelecimento de condições que nos possibilitem oferecer serviços com a qualidade que nossos clientes desejam, com previsibilidade de planejamento de custos que precisamos e a preços compatíveis com a capacidade de consumo. A Iata (Associação Internacional de Transporte Aéreos) tem feito repetidos alertas quanto aos riscos que as assimetrias nacionais trazem para o país.

Não defendemos introdução indiscriminada de modelos estrangeiros, mas a efetiva adoção dos diplomas legais dos quais o Brasil é signatário, referendados e incorporados à legislação nacional. Queremos no Brasil um ambiente com parâmetros predominantes nos mercados de referência da aviação mundial para que, assim, conquistemos e superemos os 200 milhões de passageiros por ano.


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