Folha de S. Paulo


Novo chefe faz aliança inédita de milícia com tráfico de drogas no Rio

Foi em uma reunião no bar Caminho do Céu, em Paciência, zona oeste do Rio, que o principal grupo de milicianos da cidade definiu os novos rumos da facção Liga da Justiça, formada por policiais, ex-policiais e bombeiros.

Naquele encontro, em 12 de agosto do ano passado, firmou-se uma inédita aliança entre milicianos e traficantes e foi decidido que o comando da quadrilha seria de Carlos Alexandre Braga, 30, segundo a investigação policial.

Conhecido como Carlinhos Três Pontes, o traficante passou a chefiar a Liga, que domina parte da zona oeste (a mais extensa e mais pobre região do Rio), a cerca de 30 km da Barra da Tijuca, local do Parque Olímpico da Rio-2016.

A Polícia Civil estima o lucro do grupo em R$ 1 milhão por mês com a exploração de serviços como segurança e ligações clandestinas de internet e TV a cabo em 12 bairros.

A quadrilha também invadiu conjuntos habitacionais do programa Minha Casa, Minha Vida, controlando quem ocupa os apartamentos.

Alvo agora de ordem de prisão por sua ação como miliciano, Carlinhos Três Pontes integrava a facção Comando Vermelho quando comunidades do bairro de Cosmos foram invadidas pela milícia, em 2007. "Ele era do tráfico e teria participado da invasão. Com o tempo, ganhou respeito seguindo as ordens dos milicianos", diz o promotor Luiz Ayres. Em 2009, já no grupo de milicianos, mas em posição de coadjuvante, foi preso por porte ilegal de armas.

Infográfico: Bairros são ameaçados pela milícia

'ELETRICISTA'

Diante da juíza Alessandra Bilac, disse ser um "eletricista" que morava com a mãe em Santa Cruz (zona oeste). Sua renda mensal, oficialmente, seria de R$ 1.368,13.

"Não possui anotações criminais, tem residência fixa e ocupação lícita, sendo desproporcional a manutenção de custódia", escreveu a juíza em sua decisão, apesar de condená-lo a três anos que deveriam ser cumpridos em liberdade. A Promotoria deu um parecer contrário.

De volta à favela, o miliciano ganhou a confiança do policial Toni Ângelo, que assumiu a chefia da Liga até ser preso em julho de 2013. Policiais acreditam que a chegada de Carlinhos Três Pontes ao comando da milícia foi ordenada por Ângelo, hoje preso na penitenciária federal de Campo Grande (MS).

Até ser alçado à chefia, Carlinhos renovou todos os anos sua carteira de habilitação, que expirou em janeiro de 2015. Ao subir na hierarquia da facção, ganhou motorista e só anda em modelos de luxo como Hilux ou Amarok.

A Corregedoria da Polícia Militar investiga denúncia de que ele já chegou a andar no blindado da corporação, o "caveirão", para percorrer a favela do Aço, em Santa Cruz. Pelo passeio, teria desembolsado R$ 30 mil. Carlinhos está sempre acompanhado por cerca de 15 seguranças, todos com fuzis. Alguns deles ex-policiais civis ou militares.

O miliciano ainda obriga comerciantes a comprarem cargas de bebidas roubadas, segundo investigação da Polícia Civil. Recentemente, algumas das decisões do novo chefe vêm causando uma guerra interna na Liga, segundo informações da polícia.

Carlinhos estaria se recusando a passar parte do lucro para outros chefes presos da Liga. Em retaliação, no mês passado, três pessoas foram mortas e seis feridas (uma delas, de 11 anos), e o bairro de Campo Grande (zona oeste) ficou sob toque de recolher imposto pelos criminosos.


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