Folha de S. Paulo


Invasão com 10 mil pessoas no interior de SP aguarda decisão da Justiça

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Quando dona Carminha se mudou para uma das regiões mais valorizadas de Sumaré, na região de Campinas, no início de 2012, eram poucos os que, como ela, resolveram invadir a área abandonada.

O terreno de quase 1 milhão de metros quadrados, onde até 2004 funcionou uma fábrica de equipamentos industriais, era um imenso descampado, sem infraestrutura, onde cada novo morador foi levantando seu barraco.

Sem fiscalização do poder público e dos donos da área, a Vila Soma, que começou com 260 famílias, só cresceu nos últimos anos. Os barracos foram dando lugar a casas de alvenaria e começaram a surgir pequenos comércios, igrejas, uma escola comunitária e até LAN houses.

Hoje, com cerca de 10 mil moradores em uma área equivalente a 2/3 do parque Ibirapuera, a vila é o terceiro –e o maior-campi– caso discutido pelo Gaorp (Grupo de Apoio às Ordens Judiciais de Reintegração de Posse), do Tribunal de Justiça de São Paulo. A ocupação de Pinheirinho, em São José dos Campos (SP), tinha cerca de 7.000 quando houve a reintegração, em 2012.

O grupo foi criado no fim do ano passado para tentar a conciliação em ações de reintegração de posse e, desde maio, acompanha a situação na Vila Soma.

Logo após a invasão, a empresa Soma Equipamentos Industriais, dona do terreno, pediu à Justiça a reintegração de posse. A justificativa é que a venda da área, estimada em R$ 90 milhões, seria usada para quitar parte das dívidas.

"Temos compradores para essa área e precisamos vendê-la para pagar os credores, que são ex-trabalhadores, governos", disse o administrador judicial Rolff Milani de Carvalho. O passivo da Soma e de outra empresa do grupo pode ultrapassar R$ 200 milhões, segundo ele.

Desde então, ao menos quatro ordens de reintegração de posse foram concedidas pela Justiça, a última no começo de julho. E os moradores já temem o pior.

O problema é que a alternativa apresentada até agora -construir dois condomínios com aval da prefeitura e recursos da Caixa Econômica Federal, longe da Vila Soma- não tem o apoio dos principais envolvidos.

A prefeita Cristina Carrara (PSDB), por exemplo, acredita que a construção dos prédios é impossível a curto prazo e diz que vai analisar eventual projeto do empreendimento "já que a fila para construção de moradias na cidade é grande".

A assessoria da Caixa Econômica Federal, que construiria as novas moradias por meio do Minha Casa, Minha Vida, informou, em nota, que as propostas dependem de diretrizes do município, de análises do banco e de recursos dos governos estadual e federal e que aguarda as tratativas em discussão no Gaorp.

RESISTÊNCIA

Já os moradores são contrários a deixar o local. A dona de casa Maria do Carmo Lopes Medeiros dos Santos, a dona Carminha, diz que irá "lutar até o final" para continuar ali. Aos 60 anos, ela construiu uma casa de alvenaria e furou um poço para não depender da água do caminhão-pipa. Dos seus sete filhos, quatro moram lá.

O casal Paulo Tito Vieira, 58, e Lucineide Santana Tito, 52, vizinho de Carminha, pagava aluguel de uma casa na periferia de Sumaré, com mais quatro famílias, quando foi para a Vila Soma.

"Viemos aqui passear. Aí uma irmã da igreja falou se a gente queria um pedacinho [da área]. Já estamos há três anos", conta ela. "Se tiver que sair, não tem acordo. Tem que procurar outra coisa. Mas creio em Deus", afirma.
Neusa Cândida de Macedo, 48, disse que já viveu momentos de muito medo com as ameaças de reintegração e que só não deixou a área porque não tem para onde ir.

"Teve momentos em que eu senti medo, mas ainda prefiro me arriscar, até o último momento. Só vou mudar se o trator chegar à minha porta. Enquanto ele estiver nas outras, eu vou estar aqui", diz.

Vídeo: FELIX LIMA | Edição: DIEGO ARVATE


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