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Situação é delicada para o PT, mas o partido ainda tem força, diz Haddad

Zanone Fraissat/Folhapress
O prefeito Fernando Haddad (PT) em entrevista no seu gabinete, na região central de São Paulo
O prefeito Fernando Haddad (PT) em entrevista no seu gabinete, na região central de São Paulo

Na entrevista à Folha, o prefeito Fernando Haddad disse que a situação atual do PT é "delicada", e que o partido só sairá dessa com mais "transparência".

Sobre a eleição municipal do ano que vem, quando buscará a reeleição, o prefeito disse que espera que o PP apoie sua candidatura –ou seja, sem lançar o nome do apresentador José Luiz Datena, atual pré-candidato da sigla.

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Folha - José Luiz Datena se lançou pré-candidato à prefeitura pelo PP. O sr. tentará conter essa candidatura, já que o partido é da sua base aliada e comanda uma secretaria importante e com muita verba, a de Habitação?
Fernando Haddad - Espero que os partidos que compõem a base do governo desde o início da gestão se mantenham. Não se trata de um esforço, mas uma expectativa de que o diálogo político possa consolidar uma visão de futuro para a cidade.

O sr. não acredita na candidatura do Datena?
Não quero opinar. Vamos ver como as coisas se desdobram. Temos uma mania de falar em eleição em todos os anos, mesmo quando não é ano eleitoral. É um pouco desrespeitoso com quem está na chefia do Executivo ficar tratando de eleição. Ainda temos um ano e meio.

O Datena disse que políticos de carreira destruíram São Paulo. Nem sobre isso o senhor quer falar?
Não. Acho que tem momento para isso, tem a hora da eleição, para poder fazer um debate franco, apresentar suas ideias, contra-argumentar. O mais correto é aguardar o momento oportuno.

O sr. concorda com a opinião do ex-presidente Lula de que o PT está no "volume morto"?
A situação é delicada para o PT. Mas o PT tem muita força, talvez seja o único partido que não é a expressão de seus únicos dirigentes, mas a expressão de uma base social que construiu esse ideário.

Como o PT pode sair dessa situação delicada?
Com transparência.

E está tendo transparência?
Entendo que sim. Não vejo da parte do governo nenhuma ação, nem remota, de criar obstáculos para toda a proposta de aprofundamento da discussão.

Falta um mea-culpa mais forte do PT nacional?
Ética é um atributo do indivíduo. Eu respondo pela administração municipal. Aqui [em São Paulo], o que foi feito é um trabalho impecável no combate à corrupção.

O envolvimento do PT em escândalos de corrupção não prejudica o sr., mesmo que não tenha sido contaminado diretamente por esses casos?
Estou no PT desde 1983, quando era estudante. Entendo que o PT deu uma enorme contribuição para a democracia, para os direitos sociais. Penso que as pessoas deveriam enxergar dessa maneira. Também não desejo para o PSDB, como instituição, um desgaste que o coloque a perder sua história, sua trajetória. Estamos falando de 1,5 milhão de filiados [do PT].

O sr. cogita ou já cogitou mudar de partido?
Não, nunca. Vou fazer uma analogia. Alguém da sua família comete um delito, você vai trocar de sobrenome? Você tem que lutar para resgatar a dignidade do nome da sua família. O papa Francisco assumiu a Santa Sé numa situação muito delicada. Ele não deixou de ser católico porque alguns católicos se desviaram do caminho da fé. Não é porque o momento é delicado que você renuncia a toda uma história, senão é um pouco fácil demais.

Muita gente em São Paulo vota contra o PT independentemente de quem seja o candidato. Isso o preocupa?
Isso aconteceu com a Luiza Erundina [hoje no PSB], com a Marta [Suplicy, ex-PT].

Mas a rejeição está mais forte.
Pode ser que esteja, mas isso aumenta o desafio. Tem sujeito que olha para o desafio, arruma a mochila e volta para casa. Tem outro que fala: "Parece interessante escalar isso aqui". Depende da sua postura frente à vida. Às vezes, você tem comportamentos mais ou menos oportunistas em relação às dificuldades. Há pessoas que querem se dar bem individualmente.

Foi o caso da Marta [que deixou o partido recentemente]?
Você é quem está falando.

As pessoas estão associando o PT a casos de corrupção e o sr. é desse partido. Isso não tem um peso?
Mas elas associam [o partido] também à inclusão social.

Como petista, como o sr. viu a prisão de José Dirceu?
Pelas medidas tomadas pelo seu advogado, me parece que era previsível. Ele entrou com três habeas corpus antes da prisão. Tudo leva a crer que era previsível, que era questão de tempo.

E o impacto para o partido?
Existe o impacto, existe um efeito sobre isso.

É uma decepção para o sr., que conviveu com ele muito tempo, inclusive em Brasília?
O José Dirceu é uma pessoa que conviveu com todo mundo, desde o movimento estudantil. Conviveu com empresários, artistas, políticos. Uma figura muito conhecida, que tinha muitos contatos, em todos os âmbitos.
Uma coisa que não faço é tripudiar de quem está nessas condições, nem da situação nem da oposição. Não faria se fosse alguém do PSDB. Amanhã, se o [ex-governador de Minas Gerais] Eduardo Azeredo for condenado e preso [no caso do mensalão tucano], não vai haver nenhum gesto de celebração da minha parte. Se amanhã alguém do PSDB, do mensalão tucano, for condenado, não vai ser um dia feliz na minha vida.


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