Folha de S. Paulo


Pai de aluna da USP

Pai narra drama de filha estuprada na USP e diz que fará cruzada por mais segurança

Pai da mais recente vítima de estupro no campus da USP, uma estudante de 17 anos da Faculdade de Economia e Administração, Carlos (nome fictício) reconstitui o drama da filha, que só relatou o ocorrido à família 13 dias depois do crime.

Revoltado com a insegurança na Cidade Universitária, ele afirma que iniciará uma cruzada para que a universidade tenha policiamento e segurança decentes. A seguir, o depoimento:

Eduardo Knapp - 15.jan.2014/Folhapress
A praça da USP perto de onde a estudante foi abordada pelo estuprador
A praça do Relógio perto de onde a estudante foi abordada pelo estuprador

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O crime ocorreu numa segunda-feira, 15 de junho, por volta das 18h. Ela estava indo recarregar o cartão do bandejão da universidade quando foi abordada pouco antes da praça do Relógio.

Ela foi ameaçada com uma faca e levada para uma área ao lado da praça, um pouco mais baixa, onde há muitas árvores e pedras. Todo o ato, segundo contou, durou uns 20 minutos. Depois conheci o local, foi muito chocante ver onde tudo aconteceu.

Ela costuma ficar na minha casa ou na casa dos meus pais. É filha única, sou separado da mãe, mas ainda somos muito amigos.

Naquela semana, eu e minha mãe notamos ela diferente, mais calada e arredia. Perguntamos se algo havia acontecido, mas ela atribuiu a outros fatores, como uma gripe e o período de provas finais.

Após 13 dias, estávamos na minha casa e ela disse, sem rodeios: "Pai, tenho uma coisa horrível para contar. Fui estuprada". Desci subitamente ao nono círculo do inferno de Dante. Foi devastador. Acho que ela procrastinou para contar o que aconteceu porque queria poupar a família. Ela não falou, explodiu. Ou melhor, implodiu.

Concluímos que deveríamos ser pragmáticos. Fomos à Delegacia da Mulher, mas, como era domingo, estava fechada. Na primeira que conseguimos ser atendidos, a recepção foi péssima, o policial chegou a perguntar se ela usava saia no momento do crime. O problema, nesses casos, é que a vítima é julgada junto com o criminoso.

Após registrar o boletim de ocorrência, fomos ao hospital para ela ser examinada e tomar o coquetel com remédios contra a gravidez e doenças sexualmente transmissíveis. O alívio, depois, foi constatar que os resultados foram negativos.

Minha filha é muito estudiosa, é uma das poucas estudantes que entraram na USP com 17 anos. Ela inclusive já foi aprovada e recebeu convites para estudar em universidades de outros países.

Ela é a pessoa mais forte que conheço, mas a luz dela se apagou após o crime. O trauma sempre vai existir, espero que ela aprenda a conviver com isso. O tratamento psicológico começa nesta semana, eu e a mãe dela também vamos fazer. Neste momento ela está fora de São Paulo, em retiro.

Na percepção de crueldade dos crimes, vi recentemente numa revista que em primeiro lugar vem o assassinato e logo depois o abuso sexual. É devastador. Eu sabia que havia algum risco, mas nunca imaginei que isso aconteceria com a minha filha.

Soube que a região onde ela foi abordada é conhecida como rota do estupro. É revoltante, não só pelo sociopata que fez isso, mas pelo respaldo da USP, que peca totalmente com a segurança. O campus virou uma ilha, uma zona franca do crime.

Ela é tão vítima do estuprador quanto das instituições que não querem policiamento na Cidade Universitária. E é curioso que, até agora, ninguém da USP nos procurou.

Agora iniciei uma cruzada e vou até o fim, não tenho nada a perder. Não quero vingança, não se trata de pagar uma barbárie com outra. Quero justiça! Além de prender o criminoso, vou lutar para que o campus tenha uma segurança decente.


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