Folha de S. Paulo


Unidade não tinha estrutura para isolar jovem morto no PI, diz diretor

O diretor do CEM (centro para adolescentes infratores em Teresina), Francisco Hebert Neves da Cruz, disse que a unidade não tinha estrutura para isolar dos outros três colegas Gleison Vieira da Silva, 17, que foi morto dentro da unidade na noite desta quinta-feira (16). Os quatro foram condenados pelo estupro coletivo em Castelo do Piauí (a 190 km de Teresina), de quatro garotas de 15, 16 e 17 anos no final de maio.

Os três adolescentes são os suspeitos do homicídio de Gleison, já que estavam recolhidos todos juntos no mesmo alojamento nessa unidade, separados dos demais internos. Gleison foi o responsável por delatar à Justiça os outros três menores.

O governador do Piauí, Wellington Dias (PT), disse nesta sexta (17) que pediu rigor nas investigações sobre o assassinato de Gleison Silva, 17, dentro de uma cela de um centro para adolescentes infratores em Teresina.

"Vou pedir investigação juntamente com o Ministério Público, o Judiciário, e outras instâncias, que com rigor apurem o assassinato. Toda perda, independente do crime que eles cometeram, toda vida humana tem valor. É muito triste ver essa situação acontecendo", disse.

Para o Ministério Público Estadual, houve "falha gritante" na segurança do adolescente, porque ele já vinha denunciando em depoimentos que era ameaçado de morte tanto pelos comparsas do crime quanto por outros internos.

Já o diretor do CEM disse não ter recebido da Justiça ou do governo estadual nenhuma recomendação para que Gleison fosse isolado dos três colegas. "Todos os adolescentes que estão na unidade [para onde foram transferidos] rejeitaram e fizeram uma batida de grade por mais de dez minutos".

Editoria de Arte/Folhapress

Segundo Neves, a instituição está lotada –com 84 adolescentes, mas capacidade para 60. Ele alega que não tinha estrutura física na unidade para separar Gleison dos demais condenados e que buscou proteger os quatro dos demais internos. "Se não colocasse os quatro separadamente, com certeza haveria quatro óbitos hoje [quinta]".

Ao chegarem à unidade, Neves disse ter conversado com os quatro transferidos se, diante da lotação, haveria alguma objeção de ficarem todos juntos, os quatro, no mesmo espaço, e que nenhum teria recusado. No centro anterior, o Ceip, Gleison estava isolado dos outros três adolescentes.

O diretor disse ter aberto sindicância para apurar possível negligência dos policiais de plantão e outros funcionários durante o homicídio.

Gleison foi o adolescente que deu detalhes do estupro coletivo à polícia e participou da reconstituição do crime no Morro do Garrote, de onde as meninas foram arremessadas depois de terem sido estupradas, amarradas e agredidas. Ao contrário dos outros acusados, Gleison, perante o juiz, manteve a confissão feita pelos quatro anteriormente à polícia de que estupraram e agrediram as quatro vítimas –uma delas, Danielly Rodrigues Feiotsa, 17, que morreu.

Os quatro adolescentes foram transferidos às 17h da quarta-feira (15) para o CEM. Eles ficaram por 45 dias recolhidos no Ceip, uma unidade para internação provisória. Pela lei, o prazo máximo de internação em locais provisórios é justamente de 45 dias, e, vencido o prazo, houve a transferência.

A chegada deles ao CEM provocou protesto dos demais internos –superlotada, a unidade abriga 84 garotos, apesar de projetada para 60. Por dez minutos, os adolescentes da unidade ficaram batendo nas grades, com gritos, contrários à transferência.

Penas aos condenados/Editoria de Arte/Folhapress

'FOGUETES'

O corpo de Gleison está no IML de Teresina, aguardando chegada dos parentes para liberação. Não foi autorizado que este procedimento pudesse ser feito pela assistente social de Castelo do Piauí, Ticiane Cavalcanti Chaves Martins.

A notícia da morte do adolescente repercutiu na cidade onde houve o estupro coletivo, diz a assistente. "Há uma comemoração, inclusive com foguetes, devido à morte do adolescente. A cidade está em polvorosa. Mas a família só quer que o enterro seja em paz".

Em nota, o governo do Piauí disse lamentar a morte de Gleison e que, "para garantir a segurança e integridade dos menores", os adolescentes estavam internados "em alas separadas, a fim de que não ocorressem conflitos com outros internos". A nota não explica, porém, porque Gleison, no CEM, foi posto junto com os três suspeitos de matá-lo.

O homicídio deu-se, segundo a nota, "entre os próprios adolescentes envolvidos no crime, após desentendimento entre eles" e que todos os procedimento determinados pela Justiça estão sendo "rigorosamente obedecidos".

Com a morte de Gleison, os adolescentes foram novamente removidos e estão recolhidos na central de flagrantes.

O governo, segundo o texto, "continuará tomando todas as medidas legais e que foram determinadas pela Justiça". Afirmou, ainda, que disponibiliza, desde o início das investigações do caso, assistentes sociais e psicólogos para as famílias dos envolvidos.

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CRONOLOGIA

27.mai
Quatro jovens são estupradas e atiradas do Morro do Garrote, em Castelo do Piauí. Um maior e quatro menores de idade são presos nos dias 28 e 29

1º.jun
Os quatro adolescentes apontados de cometerem o crime são transferidos do centro socioeducativo, em Teresina, para o Ceip

7.jun
Danielly Rodrigues Feitosa, 17, uma das vítimas, morre após dez dias internada. No dia 13, sua missa de sétimo dia reúne mais de 500 pessoas

11.jun
Começa o julgamento dos quatro jovens, dias após Gleison Vieira da Silva, 17, delatar que cometeu o crime com os colegas

15.jun
Ministério Público do Piauí entrega denúncia contra Adão José de Souza, 40, citado como líder do crime. Pena pode ser de mais de 150 anos

10.jul
Decisão jurídica de 24 anos de internação para os jovens. No Ceip, Gleison da Silva fica em cela separada dos outros três

15.jul
Às 17h, os menores culpados do crime são transferidos para o CEM, após permanecerem prazo máximo no Ceip. Lá, os quatro ficam na mesma cela

16.jul
Gleison Vieira da Silva, 17, é morto. A suspeita é que seus colegas de cela –que cometeram o crime junto com ele– o tenham matado por volta das 23h


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