Folha de S. Paulo


Cardozo anuncia apoio a projeto de José Serra sobre maioridade penal

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, adiantou nesta terça-feira (16) que o governo apoiará o projeto do senador tucano José Serra (SP), que amplia o tempo de internação de jovens infratores dos atuais 3 para até 10 anos.

A Executiva do PSDB, no entanto, se reuniu em Brasília e decidiu rejeitar a proposta de Serra e apoiar outras três defendidas por integrantes do partido.

Por meio do próprio ministro da Justiça, o governo já havia sinalizado que poderia declarar apoio à proposta de Serra. Além do aumento do tempo de reclusão nas unidades de internação, o texto assinado por Serra endurece as penas por cooptação de menores de idade para práticas de crimes, de dois a cinco anos, ampliadas até o dobro no caso de crimes hediondos.

A estratégia do governo, ao abraçar a proposta tucana, é defender uma alternativa à PEC (Proposta de Emenda Constitucional) que determina a
redução da maioridade penal de 18 para 16 anos, em tramitação na Câmara.

O ministro participou nesta terça da audiência pública na Comissão de Direitos Humanos da Câmara. Durante a sessão, ele voltou a dizer que a redução da maioridade não reduziria a violência e, a na visão do governo, será considerada inconstitucional.

Líder do governo no Congresso e relator do projeto na comissão, o senador José Pimentel (PT-CE) formalizou nesta terça o apoio ao projeto de Serra. O relatório apresentado por Pimentel sugere, porém, duas alterações ao texto de Serra. Estipula prazo máximo de internação de oito anos e estabelece penas ainda mais duras para adultos que cooptarem menores para o crime.

"O projeto que melhor se adequa às necessidades da sociedade brasileira é o presente que, dentre outras providências, cria um regime especial de atendimento com maior contenção para maiores de 18 anos e menores de 26 anos", afirma Pimentel em seu parecer.

Pelo projeto, seria criado um regime especial de atendimento socioeducativo para menores infratores que praticarem, mediante violência, crimes hediondos.

O texto permite que os menores infratores cumpram as medidas socioeducativas em regime especial até 26 anos de idade, com o tempo máximo de internação de oito anos. Os menores devem ficar separados dos demais presos, seja em estabelecimentos específicos ou numa ala especial dentro dos presídios.

Editoria de Arte/Folhapress

"Há condutas que não podem ser equiparadas. Um exemplo são os atos infracionais que resultem em morte, lesão grave ou gravíssima, e a prática de uma simples contravenção penal", afirmou Pimentel.

Serra também sugere que, na internação do regime especial, sejam realizadas atividades pedagógicas obrigatórias, com a acesso dos menores ao ensino fundamental, médio e profissionalizante.

Se for diagnosticada doença mental no adolescente, o projeto permite a extinção da medida socioeducativa em "caráter excepcional". Mas prevê a internação compulsória, por prazo indeterminado, sujeita a reavaliação a cada seis meses.

Pimentel sugere pequenas alterações no texto, como incluir o acesso à educação para os menores enquanto estiverem em medidas socioeducativas, mas nenhuma delas altera a essência do projeto de Serra.

DEMAIS PROPOSTAS DO PSDB

Apesar do apoio do governo, a Executiva do PSDB decidiu apoiar três propostas de integrantes do partido para a questão da maioridade penal, em discussão no Congresso Nacional. Segundo o senador Aécio Neves (MG), presidente nacional da sigla, a prioridade será dada à proposta do senador Aloysio Nunes Ferreira (SP).

O projeto de Nunes permite que, ouvido o Ministério Público, a eventual condenação de um maior de 16 anos, seja processado com base no Código Penal, ou seja, como adulto, em casos de crimes hediondos, como latrocínio e estupro. Se a avaliação for contrária, o jovem infrator continuaria a responder com base no Estatuto da Criança e do Adolescente, que estabelece internação máxima de três anos. Essa proposta já foi incorporada a um projeto que tramita na Câmara e está sendo analisado em uma comissão especial.

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), decidiu apoiar o texto tucano como forma de esvaziar as negociações que o PT estava fazendo com o PSDB em torno da matéria. Ele no entanto, quer a ampliação do escopo para outros crimes que envolvam violência, não só os hediondos –como lesão corporal grave e roubo qualificado. Esse ponto já foi aceito pelo PSDB.

O peemedebista defende ainda retirar do Ministério Público o poder de decidir, a cada caso, se irá oferecer denúncia pelo ECA ou pelo Código Penal. Segundo a Folha apurou, o PSDB deve abrir mão da exigência para viabilizar um acordo. A medida é vista como um entrave para as condenações e não tem o apoio de Cunha.

A outra proposta que será defendida pelo partido é a do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, que estende de três para oito anos a penalização máxima para os jovens acima de 16 anos, que também devem ficar presos separados dos adultos. Serra defendia uma ampliação para 10 anos de punição.

O último ponto apoiado pelos tucanos, de autoria de Aécio, triplica a pena para adultos que utilizem menores de idade para cometer crimes. Essa pena hoje é de até quatro anos. O projeto está na pauta da Comissão de Constituição e Justiça do Senado e deve ser votado nesta quarta-feira (17).

"A proposta de simplesmente deixar como está a coisa na verdade vem sendo a posição do PT ao longo de todos esses anos e do próprio governo. O PSDB fica com uma posição intermediária e, a meu ver, equilibrada", afirmou Aécio após a reunião.

A respeito da decisão do PSDB de não bancar o projeto de Serra, Cardozo disse que não fez nenhum acordo partidário. "Nós estamos dizendo que temos identidade com uma proposta apresentada pelo senador José Serra", justificou.

'ESCOLA DE CRIMES'

Cardozo classificou as cadeias brasileiras –área que está sob o guarda-chuva da pasta que ele comanda– como "uma verdadeira escola de crimes".

"Boa parte da violência, dos crimes, das situações que atingem profundamente nossa vida cotidiana e aterrorizam o cidadão, é comandada de dentro dos presídios. Ora, o que vamos colocar adolescentes dentro dos presídios para serem capturados por essa organizações criminosas?", indagou.

Ele lembrou que a alteração da maioridade pode provocar uma explosão no já superpopuloso sistema carcerário, uma vez que jovens teriam de cumprir pena nos presídios convencionais.

"Já temos 300 mil vagas de déficit (nas cadeias). Sabem qual é tempo médio de construção de um presídio? Quatro anos. Ao se mudar a redução, teremos um caos no sistema penitenciário", argumentou Cardozo.

Em 2012, Cardozo chegou a classificar o sistema prisional brasileiro como "medieval" e disse que preferia morrer a cumprir pena por longo tempo em uma prisão do país.

O ministro afirmou ainda, na ocasião, que o sistema penitenciário não consegue ressocializar os detentos. "Quem entra no presídio como um pequeno delinquente, muitas vezes sai como membro de uma organização criminosa para praticar grandes crimes."


Endereço da página:

Links no texto: