Folha de S. Paulo


Análise: Jovens correspondem ao grupo mais atingido pela violência

A Folha revelou na edição do último domingo (7) a dificuldade em se obter dados conclusivos sobre o protagonismo de jovens em determinados tipos de crimes e o quanto isso prejudica o debate sobre a diminuição da maioridade penal no Brasil.

Pistas valiosas, porém, podem ser achadas ao se mudar o filtro da busca –nem é preciso evocar deuses da psicologia para pressupor que, ao se abordar o "jovem vítima", chega-se ao ambiente onde germina "jovem agressor".

O IHA (Índice de Homicídios na Adolescência), do Laboratório de Análise da Violência da UERJ em parceria com o Unicef para a Secretaria de Direitos Humanos do governo federal, projeta, com base em dados de 2012, 42 mil adolescentes vítimas de homicídio entre 2013 e 2019.

Segundo dados do IBGE e do Sistema de Informações sobre Mortalidade do Ministério da Saúde, homicídios foram causas de morte entre adolescentes em 36% dos casos, índice que corresponde a 5% na população em geral.

Com base na Pesquisa Nacional de Vitimização, realizada pelo Datafolha em parceria com o Crisp para a Secretaria Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça, os resultados para jovens de 16 e 17 anos também revelam um perfil preocupante de vulnerabilidade.

O levantamento, realizado em 2012, mostrou que 21% da população adulta brasileira tinha sido vítima de algum tipo de crime nos 12 meses que antecederam a pesquisa. No estrato dos adolescentes, essa taxa vai a 25%.

A diferença é mais expressiva quando se analisa as agressões físicas ou psicológicas, como insultos, ameaças, chutes e socos, que vitimaram 14% do total de entrevistados no período. Na faixa de 16 e 17 anos, esse índice vai a 22%.

No estrato, também se verificam taxas de ocorrência acima da média para casos de discriminação, especialmente por cor, raça, local de moradia, religião e de episódios de furto e roubo de objetos.

Os crimes dos quais os adolescentes são vítimas ocorrem em sua maioria em locais públicos, seja em lugares externos –rua de casa (52% contra 33% na média) e parques e praças (14% contra 9%)– seja em internos –escolas e faculdades (41% contra 18%).

Os agressores geralmente são conhecidos, e a taxa de subnotificação das ocorrências é uma das maiores verificadas na população. São poucos os que relatam os episódios às instituições competentes (16% contra 20% no total).

Talvez porque aqueles jovens que o fazem ficam muito mais insatisfeitos do que a média da população (62% contra 46%). O motivo? A polícia não deu atenção à ocorrência (38% contra 25%). Aliás, a polícia, especialmente a PM, tem desconfiança acima da média no estrato.

É o segmento onde a revista pessoal é o relato mais frequente de último contato com a instituição, uma experiência narrada de maneira negativa pelo estrato, mais do que por qualquer outro na população, especialmente quanto à displicência, ao abuso de poder e à agressividade.

Somado a tudo isso, incertezas quanto ao futuro das políticas públicas que atingem a inclusão de jovens e adolescentes, como as das áreas sociais e de educação, compõem um quadro essencial a ser considerado no debate da diminuição da maioridade penal.

Desconsiderá-lo é agir como um médico negligente, que se preocupa em atenuar sintomas desconfortáveis sem atentar para a doença que o causa. O diagnóstico correto exige atenção, assim como parece pedir o jovem no Brasil.


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