Folha de S. Paulo


Mau comportamento masculino não pode ser aceito, diz antropólogo

Mais da metade das brasileiras conhece ao menos uma mulher que sofreu violência do parceiro. Levantamentos apontam que, a cada ano, ocorrem mais de 50 mil estupros no país. E 25% dos brasileiros acham que uma mulher vestida de maneira provocante merece ser atacada.

Esses e outros dados do Brasil e do mundo serão objeto de debates entre mais de 20 especialistas durante o 1º Seminário Internacional Cultura de Violência contra as Mulheres, que acontece na quarta (20) e na quinta (21), no Sesc Pinheiros (zona oeste), com inscrições já esgotadas.

O evento, promovido pelo Instituto Vladimir Herzog e pelo Instituto Patrícia Galvão, será transmitido ao vivo pela internet. Em um dos debates estará o antropólogo Matthew Gutmann, especialista em masculinidade da Universidade Brown, nos EUA.

Ele afirma que os estudos de gênero precisam englobar os homens heterossexuais para desmitificar certos estereótipos e compreender os mecanismos da persistente desigualdade entre os sexos.

Arquivo Pessoal
Matthew Gutmann, professor of Anthropology and director of Brown International Advanced Research Institutes? (BIARI). Foto: Arquivo pessoal ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
O antropólogo Matthew Gutmann, da Universidade Brown

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Leia, a seguir, trechos da entrevista.

Folha - Você poderia explicar o título da sua palestra ("Os homens são animais")?
Matthew Gutmann - É uma provocação. Obviamente homens e mulheres são animais. A questão é: o que isso significa? É muito comum o uso de termos como genes, hormônios ou hereditariedade para explicar ou desculpar o comportamento humano.
Enquanto pensarmos que comportamentos masculinos como agressividade ou apetite sexual são biológicos, perderemos o foco das questões sociais e culturais, que são as que precisam ser resolvidas.

Como essas ideias se aplicam à violência sexual?
Há ideias que se tornaram populares, como aquelas que comparam o comportamento sexual dos homens com o de outros animais, que lutam para ter acesso à fêmea. Mas, entre humanos, sexo é algo social, e o estupro é, antes de tudo, um ato de poder. É apenas o método utilizado para impor o desejo do homem de controlar a mulher.

Como proteger as mulheres?
Rio, Cidade do México e outras capitais têm, por exemplo, vagões de metrô femininos. Muita gente acha uma boa ideia, porque acreditam que os homens não conseguem se controlar.
Outras pessoas, e aí me incluo, são contrárias a isso, porque é um jeito de ceder a comportamentos inadequados e violentos. Os homens só se comportarão de forma diferente se forem confrontados e punidos. Delegacias e vagões exclusivos podem ser um passo necessário, mas isso não é o suficiente. Não podemos aceitar o mau comportamento masculino.

Existe, entre os homens, a ideia de que o feminismo é uma ameaça?
Existe a ideia de que as feministas odeiam os homens, o que não é verdade. O fato é que eles se sentem inseguros hoje porque não sabem qual é o seu papel como sabiam quando havia uma divisão clara do trabalho: mulher em casa, homem no escritório. Esse fato confunde também outras pessoas, como [a ensaísta norte-americana] Camille Paglia, que quer voltar para uma situação em que a mulher era valorizada por ser mãe. Acho que esse não é o caminho. Precisamos encontrar novas maneiras de homens e mulheres se relacionarem, sem retrocessos.

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PROGRAMAÇÃO

1º SEMINÁRIO INTERNACIONAL CULTURA DA VIOLÊNCIA CONTRA AS MULHERES
QUANDO 20 e 21.mai
ONDE Teatro Paulo Autran, Sesc Pinheiros (r. Paes Leme, 195, Pinheiros)
ACOMPANHE Transmissão ao vivo e mais informações sobre a programação em: scovaw.org


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