Folha de S. Paulo


Expedição daninha: artista explica mapeamento de plantas no Minhocão

Sentados no concreto em uma das vias do Minhocão —que, em dias úteis, recebe carros e caminhões—, futuros arquitetos, estudantes, professores e fotógrafos amadores são orientados a fechar os olhos e perceber os barulhos da cidade. O exercício que deu início à Oficina Ervas Daninhas - Desenhando o Minhocão, ministrada pela artista visual Laura Lydia, 35, foi o primeiro estágio da exploração do gigante de cimento que ocorreu neste domingo (12).

A ação fazia parte do projeto Ervas SP, criado pela artista com o objetivo de identificar a natureza viva na paisagem infértil da cidade e que resultou na catalogação das diferentes espécies de plantas que sobrevivem nas rachaduras do Elevado Costa e Silva. O segundo passo, do que na verdade foi o encerramento do programa, foi observar e desenhar alguma particularidade do espaço.

Vanessa Horiuchi, 25, está fazendo um trabalho de conclusão do seu curso de Arquitetura sobre a via expressa elevada. "Respiro o Minhocão. Fiquei sabendo da oficina em uma reportagem e vim ver. A gente trabalha muito com computador. É bom resgatar o desenho", diz.

Na sequência, todos foram convidados para uma expedição coletiva, na qual poderiam ser observadas as intervenções de Lydia, feitas com a ajuda do biólogo Vitor Barão, 26. As intromissões artísticas são desenhos de Lydia de aproximadamente 40 espécies de ervas daninhas encontradas por lá e identificadas por ela e Barão com o auxílio do livro "Plantas Daninhas", de Harri Lorenzi, e de um grupo de especialistas em taxonomia vegetal, o DetWeb, via Facebook.

Feitas com pincel sobre tinta de parede branca, as ilustrações no canteiro central ou próximas às grades laterais das vias formam um catálogo a céu aberto que sofre mudanças contínuas. "Algumas plantinhas morrem e outras florescem. Ao limpar, a prefeitura arranca algumas ou pinta o estêncil que também usamos no projeto", explica a artista.

"Ela resgata algo dos cientistas naturalistas, uma relação histórica do desenho científico. É um registro. E ela não tira a planta do lugar para fazê-lo. Amplia o olhar", diz a artista plástica Teresa Berlinck, 52, que soube da atividade por meio de redes sociais.

Conforme a pequena caravana avança, mais curiosos se aproximam. "É aqui o negócio das plantinhas?" Sim, chega mais. Na saída do largo do Arouche a caminhada já tinha 20 adeptos que ora palpitavam sobre a origem dos nomes das plantas —"pilosa vem de pêlo"—, ora relatavam a flora de seus quintais e o tráfego de sementes por intermédio de passarinhos.

O passeio de hoje acabou com uma projeção de vídeo sobre o Ervas SP, assim como o projeto, mas a ideia é fazer mais catálogos. Uma proposta com o Sesc está sendo estudada e a artista, que mora no Rio, pensa em fazer algo na capital carioca. "A natureza é muito evidente no Rio, mas há vários lugares inóspitos. Quero mapear o mundo", diz Lydia aos risos.


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