Folha de S. Paulo


Aos 81, ativista do parque Augusta vai parar na delegacia

No último sábado (17), Ana Dulce Pitan Maraschin, 81, saiu de casa cedo para ir ao parque. Acabou na delegacia.

Mãe, avó e bisavó, a professora de educação artística aposentada, não foi a um parque qualquer. Não foi nem sequer a um parque que, na prática, exista ou esteja aberto.

Ana saiu de casa porque soube que os meninos estavam entrando no parque Augusta, onde haveria um série de atividades culturais.

Resolveu apoiar. "Entrei feliz da vida porque o sonho de todo mundo é entrar quando quiser aqui", afirma a ex-professora, que tratou de assumir a bronca quando a Polícia Militar chegou.

Resultado: a senhora de ar maternal foi parar na delegacia espontaneamente para a polícia fazer o boletim de ocorrência da invasão.

"Não foi constrangimento nenhum. Nem cheguei a falar nada, só pegaram meu RG", afirma. "Mas, se eu tivesse que falar, pode ter certeza, ia dizer umas boas verdades sobre isso aqui."

O terreno de 24.752 metros quadrados entre as ruas Marquês de Paranaguá e Caio Prado, na região central da cidade, pertence às construtoras Setin e Cyrela.

Ali serão erguidas três torres que ocuparão 40% do terreno nos outros 60%, a área verde será mantida com circulação livre para todos.

Desde sábado, Ana esteve todos os dias no local, onde cerca de 300 pessoas (jovens, na maioria) se revezam em um movimento que definem como vigília criativa.

Nesta quarta-feira (21), a Justiça emitiu um mandado de reintegração de posse do terreno. Ana é citada.

"É um despropósito", diz Daniel Biral, da organização Advogados Ativistas. Segundo ele, regra do Conpresp (órgão de patrimônio) obriga manter a passagem aberta.

"Ninguém tomou posse de nada. Estamos aqui para garantir que os portões não sejam fechados, como estavam", diz o advogado.

Procurados, os representantes das construtoras não foram encontrados até a conclusão desta edição. Apesar de a liminar ter sido expedida, a PM não confirma quando a cumprirá o que pode acontecer nesta quinta (22).

No início da noite, cerca de 40 ocupantes do parque Augusta fizeram uma assembleia para discutir a reintegração. Ana estava entre eles.

Entre uma moção de apoio e uma votação sobre atender ou não a imprensa, a ex-professora diz à Folha: "Frisa aí que este é um movimento horizontal, sem líderes, tá?"


Endereço da página:

Links no texto: