Folha de S. Paulo


Opinião: Um parque não é mais legal para se reunir que uma alça de retorno?

Tem coisas que parecem só ser possíveis em São Paulo.

Ontem (28/11), o principal item oficial da decoração de Natal da cidade -uma árvore de 54 m em ferro, decorada com plástico e luzes que piscam- abdicou de ter como cenário o principal parque da cidade e seus 1.584.000 m² de áreas verdes para se postar ali ao lado, numa triste alça de retorno.

O local liga a congestionada avenida 23 de maio às igualmente abarrotadas avenidas Brigadeiro Luís Antônio, Brasil e República do Líbano. Deu pra entender que tipo de presente de Natal é esse?

Há mais de 3 km da estação de metrô mais próxima, o entroncamento é um convite ao carro. Tem um retorno em frente e outro logo adiante.

Como nos 12 anos anteriores em que esteve ali, a árvore é normalmente vista de dentro dos carros, que passam e pegam o retorno, passam de novo e pegam o outro retorno, de novo, de novo e de novo até enjoar.

Nessa brincadeira, quem cruza aquele caminho precisa de um trenó inteiro de paciência para encarar engarrafamentos extras de gente que não quer chegar a lugar nenhum, apenas dar voltas. Um suplício.

Para ir à zona oeste, haveria uma opção via Paulista, se a decoração de Natal ali também não a transformasse em piada de mau gosto.

Mais do que isso: se a tal árvore é um objeto de contemplação em torno do qual as pessoas querem se reunir para comungar do tal espírito do Natal ou apenas para distrair os olhos e dar um rolê, um parque aberto 24 horas nos fins de semana, onde é possível sentar e apreciar o piscar das luzes com calma, quem sabe até fazer um piquenique com os amigos, não parece mais legal que uma alça de retorno?

A administração que investe em ciclovias mudou de tom neste Natal. Ou tem medo de que o paulistano, dentro do parque, comece a gostar mais das árvores de verdade que daquela de ferro e plástico de até R$ 3 milhões.

Pior: ele pode, enfim, perceber que essas árvores legais são mais raras do que deveriam na maioria das ruas de São Paulo.


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