Folha de S. Paulo


Acusado de assassinatos em Goiânia mostrou vaidade, diz delegado

O avô chegou a Goiânia vindo de Pau dos Ferros, Rio Grande do Norte, aos 12 anos. Hoje tem 76. Ganhou a vida consertando caminhões e ônibus. Teve cinco filhos, dois homens e três mulheres.

Uma das filhas, Sônia Gomes da Rocha, envolveu-se em um romance aos 17, e engravidou. Nasceu Tiago. Após dois anos, ela uniu-se a outro homem e teve um segundo filho.

Calado, Tiago não brincava, não se envolvia com outras crianças. Sônia trabalhava como diarista, passava muito tempo fora. O menino ficava aos cuidados da avó e de uma das tias.

À noite compartilhava com as outras crianças a televisão da casa. Mas só até às dez, porque nessa hora o avô desligava o aparelho e apagava a luz da sala.

Weimer Carvalho/Folhapress
Colégio onde o acusado de assassinatos Tiago Henrique Gomes da Rocha, 26, estudou parte da infância
Colégio onde o acusado de assassinatos Tiago Henrique Gomes da Rocha, 26, estudou parte da infância

Sônia conseguiu um emprego na prefeitura de Goiânia. Procurava compensar sua ausência. "Dava aos filhos brinquedos caros, comprava boas roupas, vestia-os bem", diz uma pessoa da família.

Acrescenta que o mais novo (hoje casado) também falava pouco, "mas era muito mais sociável". Lembra de Tiago menino, "loirinho, com franjinha. Já nasceu lindo, podia ser modelo".

No mesmo conjunto Vera Cruz II em que viviam fica o Colégio Edmundo Rocha. Tiago cursou da segunda à oitava série, até 2002. Os professores mais antigos não acreditam que é o matador. Lembram-se de um aluno normal, "mas calado e arrumadinho".

E que um dia envolveu-se em uma briga.

Foi com outro aluno, Paulo Giovani. A mãe de Paulo, a cabeleireira Sônia da Costa, é testemunha de Jeová e não deixava o filho andar com garotos da escola, porque falavam palavrão. Um grupo deles passou a descrimina-lo.

"Meu filho me disse que o Tiago estava entre eles. Um dia contou que tinha dado uns tapas nele." A cabeleireira ameaçou levar os nomes da turma à polícia, e nunca mais incomodaram seu filho.

As moças da rua onde Tiago morava notavam um rapaz bonito e bem vestido (calça, camisa, tênis preto e branco) sair de casa, mas raramente viam-lhe o rosto. Saía de moto, já de capacete.

No Hospital Materno-Infantil, onde trabalhava, viam-no chegar com blusão de motociclista e capacete na mão. Jamais viram a moto. Às vezes dava boa-noite, outras só fazia um gesto com a cabeça. "Não conversava com ninguém", diz um ex-colega. Seu posto era a entrada do PSM, Pronto-Socorro de Mulheres.

O primeiro emprego foi como vigilante armado, de 2011 a 2013. Saiu por corte de pessoal. Este ano foi para a empresa que fazia a vigilância do hospital, com salário de R$ 1.600. Tentou aproximar-se da igreja
Assembleia de Deus, onde a mãe lia a Bíblia nos cultos. Só foi duas vezes.

O delegado Murilo Rechinelli comandou a força tarefa que prendeu o "serial killer". Diz que as atitudes dele revelaram uma pessoa lúcida e extremamente fria. Furtava placas de outras motos para disfarçar a sua.

Comprou uma capa vermelha para o tanque da moto, que é preto. Usava ora uma, ora outra.

Antes de chegar a Tiago, os policiais viam, em cenas gravadas por câmeras, em locais de crime, "um rapaz extremamente calmo, como se não tivesse o mínimo receio de ser preso, ou preocupação com a vida ou com as leis."

Preso, revelou-se vaidoso. "Fizemos a foto dele, ele olhou e não gostou; pediu para tirarmos outra", diz o delegado. Achava que seria divulgada pelo país.

Tiago ainda não foi avaliado por peritos da área de saúde mental. Procurada, sua defesa não quis falar com a reportagem. O que se tem sobre o que o levou às mortes é conclusão da polícia, baseada em interrogatórios.

Segundo a investigação, era acometido por um sentimento de ódio (ou raiva, como disse), não contra suas vítimas, mas "contra tudo". Após a primeira morte (um rapaz de 16 anos, em 2012), o ódio passou. Mas foi sendo tomado por remorso, angústia, raiva. Voltou a matar, acalmou-se, e o ciclo recomeçou.

Matou moradores de rua, gays, prostitutas e outras moças. Este ano pareceu estabelecer um padrão, ao atacar preferencialmente mulheres. Algumas vezes assassinou duas pessoas no mesmo dia. Como fez com
Bárbara Luíza e Beatriz, que caminhavam de dia por ruas diferentes.

O "serial killer" está em uma cela "isolado", segundo a Superintendência de Segurança Penitenciária.


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