Folha de S. Paulo


Sem água, moradores de Campinas (SP) recorrem a bica de cidade vizinha

Sem água desde sexta-feira (10), centenas de moradores de Campinas (a 93 km de São Paulo) recorrem a uma bica de beira de estrada para obter o necessário para as atividades básicas do dia a dia, como cozinhar e tomar banho.

"Comprei dez galões vencidos de 20 litros por R$ 50 para vir buscar água", conta o pedreiro Antônio Alves da Silva, 44, que mora no Jardim Santo Antônio, um dos bairros mais afetados pelo desabastecimento.

"Desde sexta não pinga uma gota na torneira. Zero. A caixa d'água aguentou um dia, mas desde sábado estou sem tomar banho", diz.

No sábado (11), metade da população de Campinas, terceira maior cidade do Estado, ficou sem água. Desde então, a situação melhorou um pouco, mas 20% dos 1,1 milhão de habitantes continua na seca, segundo a Sanasa (empresa de água e esgoto).

A bica fica em Itupeva, às margens da rodovia SP-324, mais conhecida como Vinhedo-Viracopos. Ali, o cenário de terra batida, com sol forte, mato queimado e gente esperando horas para obter água remete ao semiárido.

Com umidade do ar abaixo de 17% e temperatura de 37,8ºC, a mais alta do ano, Campinas decretou estado de emergência.

"Meu filho recém-nascido toma banho quatro vezes nesse calor", diz o padeiro Ronaldo Santana Andrade, 34.

Na terça (14), ele carregou uma picape com 200 litros de água –incluindo um tonel de 40 litros– após esperar por duas horas na fila. Ao longo do dia, o movimento era de cerca de 30 pessoas, mas, à noite, pode chegar a 80.

A Prefeitura de Itupeva não soube informar se a bica é pública nem se a água é potável.

O desabastecimento se deve à baixa vazão e à má qualidade da água dos rios Atibaia e Capivari, onde a Sanasa capta água (o primeiro atende 93% da cidade). Os reservatórios da empresa são suficientes para apenas seis horas de abastecimento.

O cenário no ponto de captação no Capivari é desolador. Na terça-feira, um líquido acinzentado com forte odor corria pelo leito do rio.

Moradores se queixam da qualidade da água que chega às torneiras. "A água está muito ruim, chega a cheirar peixe", afirma o operador de empilhadeira Agnaldo Lucas, que mora na região do Campo Belo. "Nunca passei por uma situação dessas, nos meus 42 anos."

A Sanasa nega. "Eu não vou mandar água de má qualidade para a população e colocá-la em risco", diz Marco Antônio dos Santos, diretor técnico da empresa.

PROTESTOS

A falta de água tem gerado uma série de protestos na cidade. Ontem, cerca de 50 pessoas queimaram pneus, galhos e entulho no Jardim Santo Antônio, bloqueando a principal avenida do bairro.

No sábado, a manifestação foi na Vila Formosa, onde a falta de água é recorrente. "Tive de comprar lenço umedecido para passar nas crianças e água mineral para elas beberem", diz a doméstica Letícia Moraes da Silva, 23, que participou do protesto.

"Ficamos de quarta a sábado sem água. Tivemos de pôr fogo e fazer barulho para mandarem água. Aí vieram três caminhões-pipa", diz Jeferson Scuro, 54, que trabalha nos Correios. "Quatro dias sem água não dá."


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