Folha de S. Paulo


USP derruba vegetação de cerrado após prometer 'museu vivo' na área

Quase metade de uma área com vegetação nativa de São Paulo foi arrasada na Cidade Universitária da USP, no Butantã (zona oeste), dois anos e dois meses após a universidade se comprometer a criar um "museu vivo" no local e a preservar a região.

Os campos cerrados devastados fazem parte de uma rara área remanescente de vegetação que deu origem a um dos primeiros nomes da capital (Campos de Piratininga).

A remoção ocorreu para dar lugar a um refeitório e a um banheiros provisórios para trabalhadores da obra do novo Centro de Convenções, que possuirá três grandes salas (uma delas um anfiteatro para 1.600 pessoas).

Após a descoberta da "relíquia ambiental", como foi chamada pela secretaria municipal do Verde, o então reitor da USP João Grandino Rodas baixou uma portaria para preservar áreas com vegetação de cerrado no campus.

Gustavo Epifanio/Folhapress
O botânico Ricardo Cardim, 36, com uma muda de murici-do-cerrado, em área desmatada da Cidade Universitária, em SP
O botânico Ricardo Cardim, 36, com uma muda de murici-do-cerrado, em área desmatada do campus

Uma delas fica perto do ICB (Instituto de Ciências Biomédicas). A outra, próxima à Faculdade de Veterinária e do novo Centro de Convenções em projeto, é a que incluía os cerca de 4.000 m² que foram parcialmente desmatados.

Nessa área, a reitoria havia prometido criar um "museu vivo" do cerrado para exibir espécies hoje raras na cidade, como o araçá-do-campo, que nomeou o antigo "Caminho do Araçá" e o "Cemitério do Araçá", e a língua-de-tucano, usada pelo padre Anchieta para fazer alpercatas.

Até hoje, o "museu vivo", que deveria ter ficado pronto em 2012, não saiu do papel.

"Foi assustador ver a área desmatada, ainda mais considerando estar no centro da inteligência e pesquisas brasileiras. E eles fizeram um absurdo plantio de mudas de árvores da mata atlântica em cima de uma vegetação raríssima", relata o botânico Ricardo Cardim, que descobriu a vegetação em 2010.

Cardim diz que a parte arrasada estava na faixa mais preservada da vegetação. Além disso, as árvores plantadas são maiores do que as normalmente encontradas no cerrado, composto principalmente de arbustos, que podem morrer devido à sombra.

A professora de botânica da USP Nanuza de Menezes lamentou o desmatamento. "Deveriam ter pedido um parecer para nós, da botânica", diz. Ela afirma que a preservação daquela vegetação tem importância histórica e ambiental. "Quanto mais exemplares houver ali, melhor para preservar o fluxo genético."


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