Folha de S. Paulo


Polícia procura terceira vítima de PMs que mataram menor no Rio

Um terceiro adolescente também foi vítima dos PMs que apreenderam dois menores no centro do Rio, no último dia 11, e levaram-nos para o alto do morro do Sumaré, onde foram baleados. Um dos jovens, Mateus Alves dos Santos, 14, não resistiu e morreu.

A informação foi dada pelo delegado Rivaldo Barbosa, titular da DH (Delegacia de Homicídios) do Rio, durante a reconstituição do crime, na manhã de segunda-feira (7).

"Existe um terceiro jovem que foi levado com os outros dois no carro da polícia, mas conseguiu convencer os PMs de que trabalhava e foi liberado antes dos outros dois serem baleados", disse Barbosa. Segundo o delegado, a polícia já tem informações para localizar essa testemunha nos próximos dias.

Barbosa também afirmou que o inquérito do caso será encaminhado à Justiça nas próximas semanas, e que o sobrevivente M., 15, que tomou um tiro na perna, de pistola, e um nas costas, de fuzil, foi essencial para o investigação.

M. participou da simulação desta segunda, que começou no centro da cidade, onde ele foi apreendido com os outros dois menores, e seguiu para o morro do Sumaré (zona norte).

Durante toda a reconstituição, o adolescente usava um capacete com uma câmera acoplada, para registrar a ação a partir de seu ponto de vista. "É para capturar áudio e vídeo e constar nos autos da investigação", disse o perito Denilson Siqueira, da Polícia Civil.

RELEMBRE O CASO

Mateus e M. foram apreendidos por dois policiais militares em uma rua do centro do Rio, na manhã do último dia 11, colocados em um carro da polícia e levados para um matagal no morro do Sumaré, próximo à casa do cardeal d. Orani Tempesta, arcebispo do Rio.

Ali, os dois foram baleados quatro vezes pelos policiais. M. foi o primeiro alvejado, levando um tiro de fuzil pelas costas e outro, de pistola, na perna direita.

"Ele [PM] me chutou, mas não me mexi, fingi de morto", relatou o jovem à Folha.

"Depois, puxaram o outro garoto de dentro do carro. Quando me viu, se desesperou e começou a gritar, mas tomou dois tiros e caiu em cima de mim, morto", disse. Os dois se conheciam apenas de vista.

Assim que os policiais se afastaram, M. saiu de baixo do corpo de Mateus, levantou-se e amarrou um casaco na perna, atravessada pela bala. O tiro de fuzil também cruzou seu corpo, deixando um furo pelas costas.

O adolescente saiu de dentro da mata e começou a descer a ladeira do Sumaré; no caminho, procurou auxílio em três estabelecimentos, mas não o ajudaram. "Disseram que não poderia ficar ali, porque a polícia voltaria." Os comerciantes também deram a entender que a região é ponto de desova (ocultação de cadáveres).

Em busca de socorro, M. caminhou até o morro do Turano, na zona norte. Um menino o levou a uma igreja, onde limparam seus ferimentos e ligaram para sua família. Seu pai o buscou no pé do morro e o levou ao hospital municipal Souza Aguiar.

De volta à sua casa, utilizou o Facebook para informar a outros garotos da comunidade o que havia acontecido, e recebeu a informação de que um adolescente da Maré estava sumido. Um dos internautas entrou em contato com uma tia de Mateus, Aline dos Santos, que foi à casa de M. e ouviu o relato do sobrevivente no sábado (14). Acompanhada de seu marido e de mais um tio do jovem assassinado, procurou a Delegacia de Homicídios na segunda-feira (16).

Encontraram o corpo de Mateus no Sumaré no mesmo dia. O pai do garoto o identificou no local. "Mesmo que ele tivesse feito algo errado, deveria ter sido levado à DPCA [Delegacia de Proteção à Criança e Adolescente]", disse o pai, Tyago Virgínio dos Santos, auxiliar de obras.

Suspeitos do crime, os cabos Fábio Magalhães Ferreira, 35, e Vinícius Lima Vieira, 32, foram presos e ficarão ao menos 30 dias em uma unidade prisional da PM, à disposição da Justiça. A corporação não informou se eles já têm advogado.

M., que parou de estudar ao completar a sexta série no ano passado, disse à Folha que estava "dando um rolê", quando foi apreendido. Contou que ele e Mateus estavam tranquilos até chegar ao Sumaré. "Ali vimos que iam fazer maldade", disse.


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