Folha de S. Paulo


Passageiros fazem 'protesto contra protesto' em Florianópolis

Cansados de perderem um dia inteiro de trabalho com a falta de ônibus, passageiros do transporte coletivo de Florianópolis se rebelaram nesta quinta-feira (8) e fizeram um protesto contra a paralisação de motoristas e cobradores da cidade.

Os rodoviários interromperam o trabalho às 7h30 e deixaram 300 mil pessoas sem ônibus. A categoria diz que 350 dos 2.500 cobradores da capital catarinense podem perder o emprego com a reestruturação do transporte na cidade.

Com os ônibus parados, às 9h30, um grupo de cerca de cem passageiros tentou fechar a ponte Colombo Salles, única saída de Florianópolis, em protesto contra a paralisação.

A Polícia Militar interveio, e impediu o fechamento. Não houve confronto, mas durante o protesto duas manifestantes foram atropeladas por um motorista que tentou furar o bloqueio —uma delas teve ferimentos leves.

Com a intervenção policial, os manifestantes foram ao terminal central, a 300 metros de distância, e gritaram contra os trabalhadores do transporte coletivo.

Os passageiros reclamam porque todos os anos, em maio, a categoria paralisa o transporte coletivo de Florianópolis. Como a ilha é grande, sem ônibus muitos passageiros ficam sem opção e perdem o dia de trabalho.

Segundo o sindicato dos motoristas e cobradores, novas paralisações devem ser feitas até que patrões e empregados cheguem a um acordo sobre a suposta saída dos cobradores.

NO LIMITE

Usuária do transporte coletivo de Florianópolis, a vendedora Rita de Cássia Pereira, 33, não participou do protesto de passageiros, mas o apoia. "A gente está no limite. Todo mês de maio é isso: a gente sai de casa de manhã e não sabe se vai ter ônibus para voltar à noite", disse.

Para a cabeleireira Silvia Oliveira, 27, ficar sem ônibus na capital catarinense é uma "tortura". "Já deveriam ter feito isso [tentar fechar a ponte] há mais tempo. Ninguém aguenta mais isso."

O motorista que atropelou as manifestantes foi detido na avenida Beira-Mar Norte, a 600 metros do ponto de atropelamento, e foi conduzido à delegacia para depoimento.

De acordo com o tenente-coronel Araújo Gomes, responsável pelo policiamento no centro, o condutor disse que "ficou assustado" com o protesto.

Sobre os ataques dos manifestantes à paralisação dos motoristas e cobradores, o sindicato da categoria disse que o transporte coletivo da cidade sem cobradores vai ficar "muito ruim". "Aqui não tem inimigo. Todos somos trabalhadores", afirmou Ricardo Freitas, do sindicato dos motoristas.

Às 11h, como estava previsto pelos trabalhadores desde o início da paralisação, os ônibus voltaram a circular.

Já o secretário de comunicação do sindicato dos motoristas e cobradores, Dionísio Lindner, disse que a categoria não interromperá o movimento por causa do levante dos passageiros.

"Acho que está justo [o protesto dos usuários]. A população tem que se posicionar", disse.

Segundo o sindicalista, novas paralisações devem ser feitas até que patrões e empregados cheguem a um acordo sobre a saída dos cobradores.

O fechamento desses postos de trabalho está previsto no novo sistema de transporte, que entrou em vigor no mês passado.

Prefeitura e empresas evitam o termo "demissão". Chamam o processo de "readequação", e prometem que só os cobradores que pedirem demissão não serão substituídos.

O novo sistema de transporte de Florianópolis começou a ser discutido no ano passado, depois dos protestos de junho.

De acordo com a prefeitura, ele prevê ajustes, como a troca de ônibus com mais de seis anos de uso, até o fim do ano que vem.

Também prevê redução do preço da passagem a partir de agosto deste ano, de R$2,90 para R$2,75, e gratuidade para 10 mil estudantes carentes.

A chamada tarifa social, hoje restrita a moradores de áreas carentes do centro, será estendida a todos os bairros.

O novo sistema é operado pelo consórcio Fênix, formado pelas cinco empresas que o operavam anteriormente.

O presidente do sindicato das empresas, Waldir Gomes, disse que o protesto de motoristas e cobradores desta quinta foi "despropositado" porque "está bastante claro que nenhum cobrador será demitido".

HISTÓRICO DE PROTESTOS

Motoristas e cobradores de Florianópolis organizam protestos anuais no mês de maio desde 2003, quando a prefeitura colocou em prática o sistema integrado de transporte.

Alguns dos protestos duraram semanas inteiras e tiveram a participação do MPL (Movimento Passe Livre), que surgiu na cidade em 2004.

Naquele ano, a ponte Colombo Salles foi fechada pela primeira vez. Houve confronto entre polícia e estudantes nas ruas do centro.

A capital catarinense também ficou conhecida por manifestações contra pedágios nas estradas.


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