Folha de S. Paulo


Sem-teto invadem terreno particular perto do Itaquerão

Sem-teto ligados ao MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto) invadiram na madrugada de ontem uma área particular de 150 mil m² em Itaquera, zona leste de São Paulo, a 2,9 quilômetros do Itaquerão, que abrigará a abertura da Copa do Mundo.

A invasão ocorre dois dias após a aprovação em 1ª votação do Plano Diretor.

O processo foi marcado pela pressão dos sem-teto aos vereadores. O texto aprovado abre caminho para a regularização de assentamentos em áreas ambientais, entre eles a Nova Palestina, na zona sul, invadida pelo mesmo grupo no fim do ano passado.

Guilherme Boulos, líder do grupo que invadiu o terreno em Itaquera, disse que cerca de 1.500 famílias ocupam a área, próximo ao parque do Carmo. A PM informou que haviam 1.000 pessoas.

Boulos diz que a decisão de invadir a área já havia sido tomada antes da aprovação do Plano Diretor, e que o ato não tem "relação alguma" com a tramitação do texto.

INVASÃO

Durante a invasão, que começou por volta da 0h30 do sábado, sem-tetos montaram barracos de madeira e bambu cobertos com lona plástica. Chegaram ao local em 17 ônibus e cerca de 50 carros.

"Bora trabalhar [na montagem das barracas]", dizia a sem-teto Patrícia Ledo, 26. "Quero uma casa para morar, não aguento mais pagar R$ 550 de aluguel", disse ela, que mora num imóvel de dois cômodos no bairro Ermelino Matarazzo, próximo a Itaquera.

A sem-teto disse que não está inscrita em nenhum programa social de habitação popular. "Não confio nesses programas, tem gente que tem dez anos esperando casa e até hoje nada", disse.

Patrícia parecia ser uma exceção -a maioria era oriunda de outras invasões do movimento.

Segundo líderes do grupo, a intenção dos sem-teto é permanecer no local, e não negociar a inclusão em projetos de moradia popular.

De acordo com a Guarda Civil Metropolitana, o terreno é particular. A Secretaria Municipal de Habitação informou que, nestes casos, cabe ao proprietário decidir iniciar uma ação para reintegração de posse.

Segundo o MTST, a área pertence a uma incorporadora, cujo nome não soube dizer, e está abandonada há anos, com dívida milionária de IPTU. A prefeitura não confirmou a informação.

A pressão dos movimentos de moradia é um dos principais problemas enfrentados pelo prefeito Fernando Haddad (PT) em seus primeiros anos de mandato.

Segundo a Cohab (companhia metropolitana da habitação), para zerar o déficit habitacional da capital seria necessário construir ao menos 230 mil casas.

Segundo Michel dos Santos Santana, 22, da coordenação do MSTS, os sem-teto que são de outras ocupações vão ficar durante três dias. "Depois ficarão apenas os que querem uma casa aqui nesse local", afirmou Santana.

Michel disse que o movimento conseguiu junto a entidades beneficentes alimentos para 1.200 pessoas para três dias. Após este período, as pessoas que ficarem no acampamento vão levar ou fazer no local sua própria alimentação.

TARDE DE SÁBADO

Durante a tarde, enquanto mais pessoas chegavam ao terreno, o MTST organizou, em uma de suas tendas, uma cozinha coletiva. Foram feitos 50 kg de arroz, 10 kg de feijão e 10 kg de salsicha. A comida foi distribuída entre as famílias.

Alguns no local reclamam da dificuldade para ir ao banheiro. Muitos têm procurado banheiros de bares na região. Outros fizeram um buraco para improvisar uma fossa.

Muitos dos que estão nas barracas estão deitados em lonas. Mas há também os que levaram colchões e barracas.

Uma das mulheres no local era Valdice Vicente da Silva, 61. Na tarde deste sábado, ela procurava alguém do movimento dos sem teto dizendo estar interessada em obter uma casa para seu filho, que paga aluguel.


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