Folha de S. Paulo


Análise: É preciso deixar para trás estigmas sobre 'black blocs' e polícia

Conduzimos uma pesquisa sobre as manifestações. Vamos até elas, observamos e conversamos com as partes envolvidas. "Black bloc" e PM são os atores principais. Como cada um deles pensa o que está acontecendo? Como cada um deles enxerga o outro?

A princípio, muitos dos PMs tinham receio de falar conosco, mas, com o tempo, as conversas começaram a fluir. Vários policiais relatam estar bastante estressados.

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A frase a seguir é típica: "Estou mais tenso em casa. Tá muito pesado para nós. Somos ofendidos o tempo todo".

Reclamam da falta de respeito nas ruas, algo que parece ferir suas identidades: "Tá difícil, ninguém mais respeita a polícia".

Oficiais criticam o aumento da criminalidade em suas regiões como consequência do desvio de recursos do combate ao crime comum para policiar manifestantes. Vários dizem não entender os motivos dos que estão nas ruas.

Por outro lado, os jovens que utilizam a tática "black bloc" sentem uma aversão clara à PM.

"A gente sabe que o policial, como indivíduo, tem muitos problemas, salário ruim, trabalho precário, mas quando ele coloca a farda é corporação e essa não vale nada! Eles matam na perifeira, batem em manifestante, jornalista, até advogado."

Os finais das manifestações são sempre os piores momentos. Todos estão mais tensos e a paciência dos PMs vai se exaurindo. A porta para os exageros se abre.

Qualquer ação policial é gravada e distribuída via internet, reforçando a imagem de truculência da PM, gerando mais ódio nos manifestantes que respondem mais violentamente.

Estamos diante de uma espiral de violência, uma dialética de ação-reação entre PM e "black bloc". É urgente sair dos estigmas manifestante-vândalo contra PM-violenta.

A polícia do Brasil está repleta de questões a serem pensadas, porém, ela é um espelho da nossa sociedade, que coloca a violência no centro das relações sociais.

É preciso um diálogo construtivo a respeito da polícia que queremos e da sociedade que queremos.

ESTHER SOLANO é professora de relações internacionais da Unifesp. RAFAEL ALCADIPANI é professor de estudos organizacionais da FGV-EAESP


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