Folha de S. Paulo


Prefeitura de SP reduz vagas para internação de dependentes químicos

A gestão Fernando Haddad (PT) encerrou contratos com três comunidades terapêuticas --clínicas para tratar dependentes químicos--, fechando ao menos cem leitos de internação.

Assinados na administração anterior, de Gilberto Kassab (PSD), os convênios venceram e não foram renovados.]

Com essa medida, a Prefeitura de São Paulo vai priorizar um modelo de atendimento que reduz internações prolongadas e mantém usuários de drogas nas chamadas unidades de acolhimento, onde é permitido que eles passem por tratamento sem ficarem isolados.

As vagas de internação fechadas, diz o município, foram "reabertas" nesses locais.

Em vez de isolamento por um período de três a seis meses, como nas comunidades terapêuticas, os usuários de drogas ficam em casas da prefeitura, com a possibilidade de sair para trabalhar ou estudar e, depois, voltar para dormir.

Apu Gomes/Folhapress
Usuários de drogas em centro terapêutico de Itapecerica da Serra, na Grande São Paulo
Usuários de drogas em centro terapêutico de Itapecerica da Serra, na Grande São Paulo

A administração municipal chama essa política de "redução de danos".

A coordenadora de Saúde Mental da prefeitura, Myres Cavalcanti, afirma que a internação prolongada de dependentes não é ideal.

Ela diz que os leitos fechados já foram repostos em novas casas de acolhimento --seis delas foram abertas neste ano, aumentando o total de unidades para 16.

PROGRAMA ESTADUAL

Mais uma tentativa de reduzir o número de viciados em crack, o novo modelo se confronta com o programa do governo paulista, iniciado em janeiro deste ano, que prevê internação involuntária --contra a vontade do dependente-- em hospitais e clínicas da rede estadual.

Representantes das comunidades dizem que a mudança põe em risco o tratamento iniciado com dependentes químicos graves.

"As famílias estão desesperadas. Tenho experiência em dependência química e não acredito em redução de danos", disse uma funcionária da Comunidade Sagrada Família, em Cotia (Grande São Paulo), que pediu para não ser identificada.

"Nesse método, a pessoa costuma usar [droga] controladamente para tentar chegar ao ponto de abstinência."

A prefeitura nega que permitirá o uso controlado.

Além da Sagrada Família, cujo contrato foi encerrado em 15 de agosto, as comunidades Estância Verão, em Cajamar (Grande São Paulo), e Padre Haroldo, em Campinas (100 km de SP), também não tiveram os acordos renovados.

Os convênios firmados com outras três entidades vencem neste ano. A prefeitura ainda estuda se haverá ou não a renovação.

Gestor de convênios da Estância Verão, o psicólogo Edson Terra Tomazi disse que o município vai precisar ampliar os leitos das unidades de acolhimento.

"Do ponto de vista técnico, não acho que a prefeitura esteja errada. O que não pode é fechar leitos sem abrir outros para dar continuidade. E não é possível dizer que isto esteja acontecendo."

MANTIDO

Usuário de crack desde os 26 anos, A., 49, desempregado, teria o tratamento interrompido numa das clínicas cujo convênio acabou. Ele se recusou a sair e pediu à direção que o mantivesse. Conseguiu.

Morador do Itaim Paulista (zona leste), A. está há cinco meses internado. "O pessoal da prefeitura queria me levar para essa unidade de acolhimento. Eu iria voltar a usar [droga], certamente. Ninguém passa o dia na rua sem usar. A recaída é muito mais fácil."


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