Folha de S. Paulo


'Morro de medo que ele volte', diz viúva de Glauco após libertação de assassino

Após saber que o assassino confesso de Glauco Vilas Boas e do filho dele, Raoni, já pode sair da clínica psiquiátrica, a viúva do cartunista disse que a decisão é um "absurdo" e que teme por sua segurança.

"Ele sabe tudo da minha vida, meu telefone, onde eu moro, o calendário de todos os eventos da igreja [Céu de Maria]. Morro de medo que ele volte ", afirmou Beatriz Galvão, 52.

"Eu lutei tanto com isso. Primeiro para sobreviver à tragédia. Depois para que ele continuasse preso. É um absurdo tão grande que estão condenando as vítimas e libertando o assassino", completa.

Carlos Eduardo Sundfeld Nunes, o Cadu, 27, recebeu autorização da Justiça na quarta-feira (7) para sair da clínica psiquiátrica e retornar para a casa dos pais. O advogado e o Tribunal de Justiça não informaram se Cadu já foi liberado.

Marlene Bergamo - 16.mar.10/Folhapress
Beatriz Galvão, mulher do cartunista, quer que o assassino de Glauco fique na clínica psiquiátrica pois teme por sua segurança
Beatriz Galvão, mulher do cartunista, quer que o assassino de Glauco fique na clínica psiquiátrica pois teme por sua segurança

A decisão foi dada pela juíza Telma Aparecida Alves, da 4ª Vara de Execuções Penais de Goiânia, que afirma que Cadu, que sofre de esquizofrenia, está apto a passar para o tratamento ambulatorial.

Segundo a juíza, após ganhar aval da equipe que o acompanha na clínica, Cadu passou pela avaliação de uma junta médica do Tribunal de Justiça de Goiás, que deu parecer favorável à liberação.

Beatriz diz que chegou a pedir à Justiça que um psiquiatra de confiança da família das vítimas fizesse parte da junta médica que avaliou o acusado, mas o pedido foi negado.

"Eu não quero vingança. Para mim, se ele ficar em uma clínica com piscina, hidromassagem, tudo bem. Eu só não quero ele solto. Ele é muito perigoso para a gente, para a minha família toda", relata.

Agora, ela diz que estuda pedir a reabertura do processo.

"Eu ainda vou ver como podemos fazer para entrar com uma ação. Se ele não responde pelos seus atos, como ele pode ficar na rua? Se é assim, então tem que pagar pelo que fez e pelos crimes que cometeu", diz.

O CASO

Glauco e o filho dele, Raoni, foram mortos em Osasco (Grande SP), em março de 2010. Após ser reconhecido pela mulher de Glauco, uma das testemunhas do ocorrido, Cadu confessou o crime.

Segundo a investigação, ele estava em surto psicótico, agravado por consumo de drogas.

Cadu conhecia a família por meio da igreja Céu de Maria, fundada por Glauco e que segue rituais do Santo Daime, como uso de chá alucinógeno.

Declarado inimputável (não responsável pelos seus atos) pela Justiça em 2011, ficou num complexo médico penal no Paraná. No ano seguinte, foi transferido para Goiânia.

Lá, passou por clínicas vinculadas ao Paili (Programa de Atenção ao Louco Infrator), da Secretaria de Saúde de Goiás, conhecido pela posição antimanicomial.

O advogado de Cadu, Sérgio Carvalho Filho, afirma que seu cliente evoluiu durante o tratamento. "Já passou da hora de ele ser liberado", afirma.

Segundo a juíza Telma Aparecida Alves, a decisão teve respaldo médico. "Mantê-lo internado seria só se sentisse nele certa periculosidade. O que o médico diz é que ele está tratado, está tranquilo e não representa perigo para a sociedade."

Ela ressalta que Cadu deve continuar em contato com psicólogos, psiquiatras e assistentes sociais ligados ao programa. "Se daqui a 30 dias ocorrer um ataque, posso interná-lo novamente", diz Alves.

TRATAMENTO

Após sair da clínica psiquiátrica, o paciente continua a ser acompanhado até a extinção da medida de segurança pela Justiça, o que não tem prazo definido para ocorrer, segundo Maria Aparecida Diniz, psicóloga e coordenadora do Paili, que acompanha o Cadu.

Marcos Labanca - 15.mar.10/Folhapress
Carlos Eduardo Sundfeld Nunes poderá ir para casa três anos após a morte de Glauco e do filho dele, Raoni
Carlos Eduardo Sundfeld Nunes poderá ir para casa três anos após a morte de Glauco e do filho dele, Raoni

Durante este período, é feita uma nova proposta terapêutica, voltada ao tratamento ambulatorial, e a família é orientada sobre os medicamentos. Relatórios também são enviados mensalmente à Justiça.

Segundo ela, os índices de reincidência dos pacientes ligados ao programa ficam abaixo de 10% e não envolvem situações graves.

"O que nos dá essa segurança de que o programa dá certo é que os índices de reincidência são baixíssimos. Não temos nenhum caso grave depois que o programa passou a acompanhar seus mais de 300 pacientes. Temos que parar de associar a loucura ao perigo. São pessoas doentes que necessitam de assistência",afirmou.

"Ninguém pode garantir que o outro vai ou não cometer [um crime]. Vemos pessoas ditas normais que reincidem muito mais que os doentes mentais", completa Diniz.


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