Folha de S. Paulo


Epidemia 'inflaciona' preço da água mineral em Alagoas

Em meio à pior seca dos últimos 50 anos, moradores de Palmeira dos Índios (AL) viram a pouca água à qual têm acesso se transformar na principal suspeita por um epidemia de diarreia que já matou 50 pessoas no Estado.

Com medo, habitantes da cidade mais afetada trocaram a água de poços e de carros-pipa pela mineral, vendida a R$ 8 o galão de 20 litros --antes da crise, custava R$ 6.

"A gente deixa de comprar pão para comprar água com medo de morrer", diz a dona de casa Marili de Oliveira, 47.

Neste ano, mais de 80 mil pessoas tiveram a doença no Estado. No ano passado inteiro, foram 45.633 --a Secretaria de Saúde não soube informar o total de mortes de 2012.

Em Palmeira dos Índios, 8.583 dos 70.738 habitantes (12%) tiveram a doença. Onze morreram. "A água das torneiras é tão barrenta que a gente precisa coar e ferver", diz Getúlio da Silva, 62. A sogra dele, Maria Felizmina de Jesus, que tinha 101 anos, morreu vítima da doença no dia 14.

De acordo com a prefeitura, idosos e crianças são as principais vítimas da diarreia.

Ricardo Rodrigues/Folhapress
Getúlio da Silva, 62, que perdeu a sogra na epidemia de diarreia
Getúlio da Silva, 62, que perdeu a sogra na epidemia de diarreia

No auge da epidemia, no início do mês, o hospital da cidade lembrava uma unidade de campanha de guerra, dizem funcionários. Foi preciso pedir macas emprestadas, improvisar enfermarias e acomodar pacientes em corredores.

"Nunca tinha visto tantas mortes assim por diarreia", diz Eduardo Arruda, diretor-médico do Hospital Santa Rita

Segundo médicos, após uma seca prolongada, as primeiras chuvas podem levar sujeira a reservatórios e causar doenças. Parte da água de carros-pipa é retirada de poços.

As condições de saneamento no município também podem ter contribuído. Segundo o IBGE, só 6% dos domicílios têm ligação com rede de esgoto ou pluvial. "Surto de diarreia como este é coisa do século passado", diz Roberto Sangueiro, provedor do hospital.

Os moradores lembram que a cidade foi administrada pelo escritor Graciliano Ramos (1892-1953), que instituiu um Código de Posturas em 1928. Um das regras proibia que os moradores jogassem "águas servidas" nas ruas.

A epidemia de diarreia em Alagoas é investigada pelo Ministério Público do Estado.

A Companhia Abastecimento de Água e Saneamento de Alagoas e o comando do Exército no Estado, que coordenam a distribuição dos carros-pipa, negam a contaminação da água que abastece as cidades atingidas.

O governo prometeu distribuir filtros caseiros para moradores. A prefeitura diz que faz limpeza em poços e cisternas para combater a epidemia.


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