Folha de S. Paulo


Passe Livre foi criado por membros do PT há 13 anos, em Florianópolis

Marco zero das manifestações que tomaram o país, os recentes protestos do Movimento Passe Livre em São Paulo são fruto de uma experiência iniciada há 13 anos.

Começou com trotskistas do PT que, desiludidos com a política partidária e influenciados pelos movimentos antiglobalização, passaram a agir de forma autônoma.

O embrião, segundo militantes, surgiu em Florianópolis. Em 2000, esses petistas fizeram uma consulta nas escolas de ensino médio para definir uma "pauta de luta". A opção mais votada foi a do passe livre para estudantes.

"Essa campanha foi sendo tocada de maneira bem modesta", conta o jornalista catarinense Daniel Guimarães, que, aos 29 anos, é um veterano --milita há uma década. Nos primeiros passos, a opção foi impulsionar um projeto de lei na Câmara de de Florianópolis, sem sucesso.

A mudança na forma de atuação ocorreu em 2003, quando estudantes de ensino médio de Salvador bloquearam ruas da cidade durante vários dias contra o aumento da tarifa --episódio que ficou conhecido como a Revolta do Buzu.

A experiência, divulgada principalmente pelo site Centro de Mídia Independente (CMI), rendeu duas lições.

A primeira, explica o militante do MPL e estudante de história da USP Caio Martins, 19, foi que, por ter sido espontâneo, o protesto não tinha representantes, e a negociação caiu no colo de entidades estudantis como a UNE (União Nacional dos Estudantes), que não participaram diretamente dos protestos.

Aparelhadas por partidos, assinaram um acordo que excluiu a revogação do aumento, principal reivindicação.

Outra lição foi o método: "Salvador ensina que é possível uma luta mais radicalizada, para tensionar o poder público", afirma Guimarães.

O exemplo foi colocado em prática nas ruas de Florianópolis em 2004, quando, pela primeira vez, aparece o nome como é conhecido hoje. Na época, o movimento já era apartidário, reunindo trotskistas, anarquistas e militantes sem ideologia definida.

O roteiro, que seria repetido novamente em 2005, seguiu um roteiro semelhante ao de São Paulo: manifestações de estudantes no final da tarde com bloqueio de ruas e ataques a terminais.
A repressão policial também exagerou, mas os protestos continuaram, ganharam adesões e obtiveram a revogação da medida.

Guimarães afirma que os protestos no final da tarde são tanto para parar a cidade como para conseguir a simpatia de trabalhadores no final do expediente.

Já a ausência de carro de som e discursos é uma característica de São Paulo e serve para "rechaçar a história de usar o protesto como massa de manobra", diz ele.

O movimento hoje está em cinco cidades: Goiânia, Brasília e Joinville (SC), além de Salvador e São Paulo, onde tem 80 militantes --de classe média e de média-baixa e idade média de 23 anos, de acordo com Guimarães.

"O MPL tem hoje uma visão madura, que entende apartidarismo como não antipartidário e dialoga bem com os partidos", diz Pablo Ortellado, do curso de gestão de políticas públicas da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP.

O sucesso recente criará "Lindberghs Farias"? "Duvido", diz Ortellado, que escreve sobre o MPL desde 2004. "Eles são ideologicamente contra a forma Estado."


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