Folha de S. Paulo


PM que atingiu jornalista da Folha diz que tiro era contra grupo que o atacava

O disparo que atingiu o rosto da jornalista da Folha Giuliana Vallone tinha como destino original manifestantes que atacavam a polícia, mas bateu no chão e acertou a repórter, disse o comandante da Polícia Militar Benedito Meira.

Segundo o oficial, o fato de um jornalista ser atingido por uma bala de borracha faz parte do "risco da profissão" que surge quando o repórter decide acompanhar protestos perto de manifestantes.

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Meira afirmou que a PM ouviu pessoas que testemunharam o tiro que feriu a jornalista e concluiu que a bala de borracha foi disparada no momento em que integrantes da tropa de choque da polícia entravam no ônibus da corporação e passaram a ser apedrejados por manifestantes.

De acordo com Meira, um policial já identificado atirou para reagir ao ataque mas a bala acabou ferindo Vallone, que acompanhava a ação de dentro de um estacionamento.

"Ele [PM] atirou em direção àqueles manifestantes exatamente para cessar aquela agressão. Quando ele efetuou esse disparo ricocheteou e atingiu a garota dentro do estacionamento. Ele efetuou o disparo e embarcou [no ônibus]".

O comandante disse que esse tipo de ferimento pode ocorrer quando um jornalista decide cobrir um protesto perto de manifestantes.

"O repórter tem duas opções: ele pode estar acompanhando o efetivo da Polícia Militar e pode estar acompanhando os manifestantes. Se houver um confronto e ele estiver acompanhando os policias militares, pode ser atingido por pedradas, paus, rojões e morteiros. Se ele estiver acompanhando os manifestantes... o que a Polícia Militar usa nessas ocasiões é munição química e de elastômero (bala de borracha)... ele pode ser atingido. Esse é o risco da profissão dele e é o risco da profissão nossa também", afirmou.

O comandante disse que o disparo contra Vallone não partiu de um policial integrante de uma unidade da Rota (Rotas Ostensivas Tobias de Aguiar), mas sim da Tropa de Choque. De acordo com o oficial, a Rota não estava atuando na manifestação, mas estava em ação nos bairros de Moema, Higienópolis e Jardins "em razão de roubos a restaurantes".

A AÇÃO

A jornalista conta que estava com colegas do jornal subindo a rua Augusta quando se deparou com a Tropa de Choque.

Ela diz que na sequencia foi abordada por uma pedestre que pediu informação de como chegar à avenida Paulista. "Falei para ela esperar pois tinha o tumulto e a orientei a entrar em um estacionamento para se proteger. Entrei com ela no local e sai novamente para ver se eles [policiais] tinham ido embora. Eles entraram no caminhão e voltei para falar para mulher que ela podia sair. De repente, eles saíram de novo. Não entendi o motivo".

Giuliana conta que um policial, que estava a cerca de 20 metros de distância, mirou em sua direção e disparou. Ela conta que estava com o crachá da Folha pendurado no pescoço, mas acredita que o policial não tenha visto a identificação. "Não estava protestando, não tinha nenhum manifestante na rua em confronto. Ele simplesmente apontou a arma na minha direção e atirou. Eu estava na porta do estacionamento, na calçada."

Diego Zanchetta/Estadão Conteúdo
Giuliana Vallone, repórter da Folha, que foi atingida por um disparo de bala de borracha da tropa de choque da polícia militar
Giuliana Vallone, repórter da Folha, que foi atingida por um disparo de bala de borracha da tropa de choque da Polícia Militar

Para a jornalista, o policial teve a intenção de atingi-la. "Eu não estava filmando, não estava tirando foto. Estava apenas na rua quando ele disparou", afirma.

Giuliana conta que cobriu os protestos de terça-feira (11) e de ontem e que a violência por parte da polícia estava maior no último protesto. "A situação estava fora de controle. Na terça, existia confronto. Ontem, as pessoas pediam para não haver violência e mesmo assim a PM jogou bombas e atirou com balas de borracha".

Para a Folha, o secretário Fernando Grella Vieira (Segurança) afirmou ontem: "Eu me solidarizo e lamento o episódio. Quero dizer que vamos apurar o ocorrido. Se ficar comprovado, vai haver responsabilização."

Giuliana voltou a enxergar na manhã desta sexta-feira (14). Ela foi ferida na região do olho direito. Além dela, outros seis repórteres da Folha foram atingidos durante a cobertura do protesto.

A jornalista está internada no hospital Sírio Libanês desde ontem e deve receber alta amanhã (15) pois ainda precisa passar por alguns exames e continuar com a medicação intravenosa. Giuliana levou pontos na pálpebra por conta do ferimento.

Os médicos disseram à repórter que os óculos de grau ajudaram a salvar a sua visão.

Giuliana disse que, ao ser atingida, seu maior medo foi perder o olho. Ela conta que ontem, devido ao grande hematoma, o médico não conseguiu examiná-la direito. "Hoje meu olho ainda está bem roxo e inchado, mas consegui enxergar. O médico disse que foi um milagre", conta.

A jornalista disse que o médico descartou o descolamento da retina. "Se eu tiver qualquer problema na retina mais para frente, o médico disse que vai ser mais fácil de tratar." Procurado, o hospital ainda não divulgou o boletim com o estado de saúde da paciente.


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