Folha de S. Paulo


Análise: Tarifa zero significa abrir mão dos investimentos

O lema do Movimento Passe Livre é tarifa zero, transporte público gratuito para todos. Uma bandeira que parece utópica numa cidade como São Paulo, onde, só para os ônibus, significaria consumir perto de R$ 6 bilhões por ano dos cofres públicos --mais de 14% do Orçamento do município.

Em tese, fazer essa opção seria abrir mão, durante um mandato, de recursos equivalentes ao plano de metas completo da gestão Haddad, para todas as áreas (da construção de 150 km de corredores de ônibus à de 43 Unidades Básicas de Saúde).

Mas a bandeira do grupo tem, como mérito, provocar um debate pertinente: prefeituras, Estados e União não deveriam dar mais subsídios a ônibus, metrô e trens?

A subvenção ao transporte público no Brasil sempre carregou uma imagem pejorativa, como se fosse jogar dinheiro no lixo. Tanto que é uma política minoritária em grandes municípios, embora seja amplamente adotada em países desenvolvidos, com destaque para a Europa.

Subsidiar é tirar verba pública para cobrir parte dos custos do sistema e, com isso, permitir uma tarifa menor.

A medida costuma ser considerada socialmente justa, não apenas por beneficiar os mais pobres como por favorecer um tipo de deslocamento mais vantajoso para toda a sociedade. Um contraponto aos subsídios indiretos aos carros, com a construção de avenidas, por exemplo.

O problema é que, por trás do conceito favorável do subsídio há armadilhas.

Uma delas é que, atualmente, esses recursos não financiam apenas quem mais precisa. Exemplo: as empresas que pagam vale-transporte dos seus empregados.

Ou estudantes de classe média ou alta, que pagam meia tarifa, parcialmente às custas do trabalhador informal que não ganha desconto.

Ou seja, subsidiar mais, sem critérios de renda, significa acentuar distorções.

Outro obstáculo é que, com mais subsídios, sobra menos dinheiro para investir. Neste ano, a prefeitura já vai gastar R$ 1,2 bilhão com subvenção aos ônibus. Em um mandato de quatro anos, só isso já significa abrir mão de dinheiro suficiente para uma nova linha de metrô com 10 km.

Por mais justo que seja baratear a tarifa, suas vantagens são questionáveis se for para ter menos, mais lentos, precários e superlotados serviços de transporte coletivo.


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