Folha de S. Paulo


Policiais e manifestantes entram em conflito, mas Marcha da Maconha segue

Manifestantes que participam da Marcha da Maconha neste sábado (8) em São Paulo entraram em conflito com policiais. O ato, que começou na av. Paulista, vinha ocorrendo de forma pacífica até que, na altura do número 1.029 da rua Augusta, um manifestante se desentendeu com um PM, que o prendeu.

Na sequência, integrantes da marcha tentaram impedir a detenção e hostilizaram os policiais, atirando latas de cerveja e outros objetos. Os PMs responderam com golpes de cassetete e spray de pimenta.

Houve correria e confusão até a altura da esquina da Augusta com a rua Costa, quando os PMs fizeram uma linha de contenção e a marcha foi retomada.

A polícia informa que uma pessoa foi presa por posse de entorpecente e encaminhada para o 78º DP, nos Jardins. A advogada Carolina Freitas, 23, diz que tentou conversar com os policiais sobre a situação do jovem, que estava com um baseado na mão, mas um policial tentou imobilizá-la e a agrediu com dois golpes de cassetete.

Eduardo Anizelli/Folhapress
Manifestantes entram em conflito com a policia durante Marcha da Maconha na Rua Augusta em São Paulo
Manifestantes entram em conflito com a policia durante Marcha da Maconha na Rua Augusta em São Paulo

De acordo com o major Élcio Góes, comandante da operação da PM, 150 policiais foram destacados para acompanhar a marcha. O esquema de segurança inclui a chamada "operação Olho de Águia", na qual duas motos equipadas com câmeras vão filmar o ato, enviando as imagens automaticamente para uma central de monitoramento

Góes disse acreditar que não haveria consumo de maconha durante o ato, mas que seria feita a repressão caso o uso da droga fosse flagrado pelos policiais.

No entanto, já com a caminhada em curso pela rua Augusta, que foi ocupada nos dois sentidos, a reportagem da Folha presenciou o uso da maconha por diversos manifestantes, sem que os policiais tomassem qualquer iniciativa para coibir a prática até aquele momento.

A MARCHA

A manifestação de hoje é a segunda Marcha da Maconha realizada em São Paulo depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) assegurou a legalidade desse tipo de protesto, em junho de 2011.

A concentração para o ato começou às 14h no vão livre do Masp e seguiu em direção ao centro da capital. Em acordo com os manifestantes, a Polícia Militar liberou a ocupação de três faixas da via no sentido Consolação.

Neste ano, o ato tem como lema a frase: "Proibição mata: legalize a vida". A organização da Marcha esperava cerca de 5.000 participantes, atraídos por shows de bandas de rap e reggae que acontecerão na região da praça da República.

Às 17h40, o tenente Becker, subcomandante da operação, estimava a presença de cerca de 1.000 pessoas na marcha. Já a organização do ato fala em 10 mil participantes. Renato Cinco (Psol), vereador no Rio de Janeiro, disse que essa foi a maior marcha que ele já presenciou o no país.

ALVOS

Segundo o cientista social Marco Saião Magri, 27, que integra a organização do movimento, a marcha tem como "alvo" autoridades que tem defendido o aumento da política de repressão às drogas, com o deputado federal Osmar Terra (PMDB-RS), autor do projeto de lei que endurece penas para o tráfico, e a ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, que se declarou contra a descriminalização das drogas.

Outro alvo das críticas, segundo Magri, será o psiquiatra Ronaldo Laranjeira, coordenador do programa de combate ao crack do governo de São Paulo. O movimento é contra o incentivo à criação de comunidades terapêuticas para o tratamento de usuários, que também pode incluir a internação compulsória de dependentes.

"São Paulo deu o azar de ter, nas três esferas de governo, autoridades que seguem investindo nessa estratégia de enfrentamento que já se mostrou fracassada", disse Magri.

A marcha também abrirá espaço para a manifestação de outros grupos, como o movimento feminista, que critica a aprovação por uma comissão da Câmara do chamado Estatuto do Nascituro --projeto encampado por líderes evangélicos que pode restringir os casos de aborto legal em caso de estupro e risco de vida para a mãe.

REAÇÕES

Apesar de liberada, a Marcha da Maconha continua despertando reações extremadas entre simpatizantes e opositores da causa.

O videomaker Grima Grimaldi não mediu palavras para defender a legalização da cannabis. "Fumo desde os 17 anos, tenho 57 e nunca escondi isso. Você pode ter um monte de bebidas em casa, mas não pode ter um pé de maconha. É um absurdo", disse ele, que fez questão de se qualificar como "documentarista e maconheiro".

"Meu filho é músico. Hoje mora em Londres. Fumo na frente dele desde que nasceu e mesmo assim ele nunca pegou num baseado", prosseguiu Grimaldi. "Os pais hoje vivem numa paranoia. Se o filho quiser fumar, ele vai fumar".

Já o aposentado Enio Semeguine, 64, criticou a manifestação e se disse contrário à legalização da maconha."Tenho um amigo que perdeu tudo, casa, trabalho, família, porque o filho era viciado em drogas", disse.

O holandês Paul Kniest, 48, que mora no Brasil e trabalha na área de tecnologia., defendeu a Marcha. Apesar de dizer que nunca usou drogas, Kniest disse que a liberação na Holanda não aumentou o número de usuários. O único "efeito colateral" para ele, foi o aumento do número de turistas de países vizinhos que vão à Holanda apenas para consumir a droga nos "coffee-shops".

Marilena Leão, 70, caminhava pela avenida Paulista enquanto a marcha avançava em direção à rua Augusta. Para ela, a legalização da maconha pode ser positiva se diminuir o tráfico de drogas no país. "Se legalizar, tira o traficante da jogada. O traficante é que é terrível, fica no bem-bom e a arraia-miúda é que acaba presa", comentou.


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