Folha de S. Paulo


Caixa da boate confirma superlotação da casa

Sobrevivente do incêndio na boate Kiss, em Santa Maria, a estudante Bruna Claussen, 19, é testemunha-chave na reconstituição dos fatos que levaram à morte de pelo menos 237 pessoas na madrugada do último dia 27.

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Bruna trabalhava no caixa da boate, onde sua função era "contar e carimbar uma a uma" as comandas da casa.

A polícia acredita que a Kiss estava superlotada na hora do incêndio, o que pode ter agravado a tragédia, e vem retendo comandas localizadas entre pertences das vítimas para tentar elucidar a questão.

O plano de segurança da casa, que estava vencido, permitia a entrada de até 691 pessoas.

Testemunhas ouvidas pela polícia estimaram haver entre 900 e 1.500 pessoas na boate no momento do fogo.

As palavras de Bruna reforçam a tese da superlotação --ela estima em 800 o número de clientes naquele noite. Diz ainda que a boate sempre colocava mil comandas no caixa, embora essa lotação nunca tivesse sido alcançada.

"Eu organizava as comandas em bolinhos de cem. Eram sempre mil. Naquela noite, tinha cerca de 800 pessoas. Às 2h45 [por volta do início do incêndio], eu perguntei ao gerente, e ele disse: 'Não deu 800 ainda'. Tinha cerca de 800. Coloco minha mão no fogo que nunca teve 1.500 como estão dizendo", afirmou à Folha.

GRATIDÃO

Funcionária da boate há um ano e meio, Bruna expressa gratidão ao sócio da boate Elissandro Spohr, o Kiko, 28, preso sob a acusação de responsabilidade na tragédia. "Ele ajudava todo mundo."

A estudante ainda não prestou depoimento completo à polícia --o primeiro foi interrompido quando recebeu a notícia da morte de uma amiga no incêndio.

Bruna diz se sentir ameaçada por ser funcionária da Kiss, e está saindo menos de casa por isso. A reportagem levou três dias para convencê-la a conceder entrevista.

"Fui na caminhada da paz. Passou a irmã de uma amiga que morreu e disse 'O que estão fazendo aqui?', como se a gente tivesse alguma culpa", lamentou.

Bruna diz ter perdido "mais de 30 amigos" no incêndio, entre eles Pâmela Lopes, 19, vizinha e melhor amiga, atendente no bar da Kiss. Segundo Bruna, 16 funcionários da boate morreram.

A estudante contradiz a versão de Mauro Hoffmann, 48, o outro sócio da Kiss, cuja defesa sustenta que ele não participava da gestão da casa. Afirma que ele estava lá em todas as festas --na noite do incêndio, não o viu.


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