Folha de S. Paulo


Jaca supera rejeição e ganha espaço na cozinha substituindo a carne

Enorme e desajeitada, a jaca é a maior entre todas as frutas comestíveis –as grandes podem passar dos 40 quilos. Cresce quase o ano todo e só é mais rara entre os meses de junho e agosto.

Nativa da Ásia (Tailândia, Indonésia, Índia, Filipinas e Malásia), foi trazida ao Brasil pelos portugueses e se adaptou facilmente ao nosso clima quente e úmido. Mas, verdade seja dita, nunca foi muito popular por aqui.

O preconceito tem seus porquês. Além do perfume extremamente forte, que incomoda muita gente, sua polpa solta um visgo que não sai da pele nem por decreto -para manuseá-la, é preciso untar mãos e utensílios com óleo ou azeite.

Aos poucos, porém, a história desse patinho feio começa a mudar. Muito nutritiva e energética, a jaca está virando protagonista em dietas veganas, nas quais entra como substituta da carne -a prática foi tema de reportagem do jornal britânico "The Guardian" no mês passado.

A textura da fruta, quando cozida, colabora para o disfarce -a polpa se separa em fios que lembram bastante as fibras do frango cozido ou da carne assada.

Em São Paulo, o chef Felipe Grecco, do bar Tubaína, lança mão da jaca para rechear coxinhas e rissoles que compõem uma porção de petiscos veganos (R$ 19,90).

"Um pouco antes de amadurecer, a jaca é um ingrediente neutro, que pega bem qualquer tempero. Depois de refogá-la, a cozinho no caldo de legumes com um toque de curry. Fica fácil de desfiar."

A variedade dura, de sabor e aroma mais suaves e textura firme, se presta melhor ao uso em receitas salgadas. É o tipo preferido da chef Ana Luiza Trajano, do restaurante Brasil a Gosto -em seu novo menu capixaba, um purê de jaca e mandioca vai à mesa como guarnição da rabada.

"O segredo é não deixar que ela roube a cena", ensina a chef, que se confessa louca pela fruta desde menina. "Como uma inteira se me deixarem. Adoro guardar os gomos no freezer e comê-los que nem sorvete."

A chef Roberta Sudbrack, que elege um ingrediente para estudar a cada ano, debruçou-se sobre a jaca em 2014. Ela e a equipe do restaurante carioca que leva seu nome, recém-estrelado pelo guia "Michelin" Brasil, desenvolveram preparos fora do comum.

Entraram no menu um chá de jaca fermentada, servido com carne de sol, e um picles de jaca verde, oferecido com ovas e geleia de caqui.

"Fomos em busca da delicadeza da fruta. Foi sensacional demonstrar essas possibilidades de um ingrediente tão diferente", diz a chef.

A seção das sobremesas, contudo, continua sendo o território da jaca por excelência. Nela, domina a variedade mole, bem mais doce e perfumada -mas os cozinheiros já arriscam muito além da tradicional compota.

A chef Morena Leite, do Capim Santo, serve sorvete de jaca como guarnição dos minichurros. Ela também publicou uma receita de crème brûlée de jaca em seu novo livro, "Mistura Morena" (editora Senac).

Criada em Trancoso, na Bahia, Morena diz não abrir mão da fruta que crescia em seu quintal e tem sabor de infância. E não se dobra ao preconceito do público, tanto que desenvolveu técnicas para driblá-lo. "Sirvo em eventos sem dizer do que se trata. As pessoas amam e pedem mais."

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NÃO VALE POR UM BIFINHO
A jaca é mesmo uma fruta saudável, rica em fibras, minerais e vitaminas A, B2 e B5. Mas não o suficiente para substituir a carne.

Segundo Paulo Prati, da consultoria ChefNutri, a fruta gigante é pobre em vitamina B12 e proteínas, justamente os nutrientes mais necessários para os adeptos da dieta vegana.

ONDE COMER

Tubaína
Onde r. Haddock Lobo, 74, Cerqueira César; tel. (11) 3129-4930

Capim Santo
Onde al. Min. Rocha Azevedo, 471, Cerqueira César; tel. (11) 3089-9500

Brasil a Gosto
Onde r. Prof. Azevedo Amaral, 70, Jardim Paulista; tel. (11) 3086-3565


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