Folha de S. Paulo


Site que sugere boicote a restaurantes revela insatisfação de 'foodies' com os preços em SP

As queixas sobre o valor da conta dos restaurantes de São Paulo não se restringem mais às conversas de mesa de bar. Acabam de ganhar tribuna on-line em tom de irritação e ironia.

Editoria de Arte

Criado no último dia 8, o site BoicotaSP reúne reclamações enviadas por usuários sobre preços de estabelecimentos paulistanos.

São lugares que "cobram demais e entregam de menos", anuncia a página, que obteve sucesso rapidamente.

Em uma semana, o BoicotaSP recebeu mais de 200 reclamações, das quais 73% referiam-se a itens de restaurantes, bares e padarias.

Nesse período, acumulou mais de 33 mil "likes" em sua página no Facebook.

Leia entrevista: 'Não censuramos nada', diz criador do BoicotaSP

Um dos alvos foi o milk-shake com sorvete Häagen-Dazs, uísque Jack Daniel's e cerveja Guinness da hamburgueria Meats, em Pinheiros, na zona oeste de São Paulo. Custa R$ 40. Vale?

Sim, para o chef e proprietário do Meats, Paulo Yoller. "São ingredientes importados, que aqui custam caro. Quis trazer uma coisa diferente para São Paulo e estou sendo massacrado por isso."

Depois da primeira queixa, o site recebeu outras 25 críticas ao Meats. Por outro lado, 21 internautas saíram em defesa da hamburgueria.

O BoicotaSP foi a fonte de inspiração para o site SP Honesta, lançado apenas dois dias depois do primeiro.

O princípio é o mesmo: os preços estão altos nos restaurantes. O SP Honesta, no entanto, não é arena para ataques e defesas, e sim um espaço de incentivo para que as pessoas conheçam lugares bons e baratos.

Esses novos sites embarcam em uma insatisfação amparada pelos números.

Nos últimos 12 meses, a inflação acumulada no Brasil, de acordo com o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), atingiu 6,6%.

Já comer fora de casa no país, no mesmo período, ficou 10,3% mais caro. Agora, se o universo for a Grande São Paulo, a conta sai ainda mais salgada -a alta foi de 12,3%.

Os preços subiram em virtude dos custos de manutenção, dizem os empresários do setor. Gastos com matéria-prima, impostos e aluguel são os que mais pesam, afirmam.

E assim, insatisfeitos, muitos "gourmets" reduzem as idas aos restaurantes, criando alternativas, como cozinhar mais em casa.

Editoria de Arte/Folha

COZINHAR MAIS E SAIR MENOS

Os "foodies" paulistanos não são mais os mesmos. Incomodados com os preços altos, esses aficionados por restaurantes têm reduzido a frequência com que comem fora de casa. É o que diz a maior parte das pessoas ouvidas pela reportagem.

Além de aumentar o rigor na escolha do restaurante, passaram a cozinhar com mais frequência em casa.

"O lugar que cobrava R$ 30 por uma refeição, em 2011, hoje cobra R$ 50 pela mesma coisa", reclama Atair Trindade, 28. "Vejo que não vale a pena gastar tanto em comida", diz o publicitário, que reduziu de cinco para três vezes por semana suas saídas.

O autor do blog "Alhos, Passas e Maçãs", que mantém identidade anônima, encontrou como alternativa frequentar lugares "híbridos", que sejam ao mesmo tempo bar e restaurante. "Assim é possível não ficar tão preso ao prato principal, que eleva a conta a R$ 100 facilmente."

Foi a "birra" com os preços altos, aliás, que levou a jornalista Rebeca de Moraes, 27, a criar, com uma colega, o site colaborativo SP Honesta. "Em um dia, recebemos mais de 120 dicas legais. Nós apenas apertamos o botão, organizamos uma ideia que era de todos."

FAÇA VOCÊ MESMO

O artista plástico Marcos Brias, 32, reduziu de cinco para duas vezes semanais o hábito de comer fora. "Cozinho de tudo. Quando eu saio, passo raiva. Não é que a comida seja uma porcaria, mas qualquer um pode fazer."

Cozinhar em casa também virou rotina para a estilista Ana Paula Tieko, 28, que anda fazendo testes para preparar molhos iguais aos dos restaurantes que frequenta.

Já o músico Vinícius Calderoni, 27, gosta tanto de ir a restaurantes que, em 2011, comia fora sete vezes por semana. Hoje, dá, no máximo, quatro "escapadas" semanais e evita correr riscos.

"Os restaurantes não baixam o preço para não desvalorizar o produto. Selecionam o público de um jeito elitista, que é o pior possível."

A sensação de abuso também é sentida pelo designer gráfico Rogério Ianelli, 28. "Tenho a impressão de que os donos subestimam o senso crítico dos clientes e pensam 'eles vão vir de qualquer jeito, não importa o preço'."

Leia também: Casas atribuem preços ao custo dos bons ingredientes

JEITINHO

Com a experiência de quem come fora pelo menos cinco vezes por semana, a administradora Ana Kanamura, 29, aprendeu a não pedir couvert e a levar o próprio vinho em restaurantes que não cobrem pela rolha.

"Alguns se impressionam com casas frequentadas por famosos, mas quem gosta de comida não se satisfaz com isso", afirma.

Kanamura, que já teve um restaurante, reconhece que é difícil cobrir os custos, o que explica os preços mais altos.

A empresária Nina Loscalzo, 29, que realiza eventos de gastronomia, diz que os restaurantes não devem ser o foco da revolta. "Os alimentos estão muito caros. O cliente não imagina quantas coisas estão embutidas no preço."

ATÉ 30% MENOS

Uma alternativa para diminuir a conta é reservar mesas em sites e aplicativos. No Grubster, o cliente paga R$ 10 e ganha 30% de desconto na conta. No Restorando e no República Gourmet, a reserva é grátis e há promoções.


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