Folha de S. Paulo


Lagoas dos Lençóis Maranhenses são convite para mergulho

Christian Tragni/Folhapress
Vista do Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses, parque natural com cerca de 330 km quadrados nas margens do rio Preguiças, no Maranhão.
Vista do Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses, parque natural com cerca de 330 km quadrados nas margens do rio Preguiças, no Maranhão.

Esta é a história de um blefe. Durante anos, quando amigos estrangeiros em visita ao Brasil me perguntavam que outro lugar eles deveriam conhecer aqui –além, claro, do Rio de Janeiro, ainda a principal porta de entrada dos turistas– eu respondia sem hesitar: Lençóis Maranhenses.

Talvez pegos de surpresa, esses visitantes seguiam meu conselho –e sempre retornavam com as histórias mais esfuziantes de tal experiência. Relatos que eu ouvia, confesso, com um certo desconforto– não por desacreditar das maravilhas que eles haviam presenciado, mas pelo simples fato de que... eu mesmo não conhecia os Lençóis Maranhenses!

Sim, eu blefava –mas eu tinha certeza de que minha indicação não era vã. Os Lençóis sempre ocuparam no meu imaginário uma posição de destaque. Sabe aqueles lugares que estão sempre na sua lista de prioridades –só que você vive adiando a viagem para lá? Era um desses casos –assim como Fernando de Noronha, o Amazonas profundo e até mesmo as Cataratas do Iguaçu.

Eu sei o que você está pensando. Um brasileiro que se orgulha de, por exemplo, já ter ido quatro vezes a Luang Prabang (Laos) e nunca viu tais maravilhas da sua própria terra? Pois... Em minha defesa, digo que ainda tenho muito fôlego para viajar por este Brasil. E que, talvez, a demora em chegar a tais destinos é mais que recompensada quando eu estou lá. Foi assim na semana passada, quando, então, por fim, eu conheci esse paraíso –um adjetivo que sempre reluto em usar, mas que, no caso, é quase insubstituível.

Não sem antes, claro, sobreviver a uma sofisticada logística que incluía: achar um voo razoável para São Luís –injustamente esquecida pela nossa malha aeroviária; encarar quatro horas de carro entre a capital do Maranhão e Barreirinhas –o acesso mais próximo do Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses; cruzar de barco um trecho do malemolente rio Preguiças –deslizando por suas águas quase estáticas; sacolejar numa 4X4 por quase uma hora e só então subir uma duna cruel de quase 100 metros de altura.

Uso ironia para descrever essas agruras, mas não exagero. O caminho é sim tortuoso. Só que uma vez lá... Descrever esse cenário é um desafio até para o repórter-viajante mais criativo. Diante dos olhos, apenas dunas, lençóis de areia que se movimentam tão lentos quanto a elipse da própria Terra em torno do Sol. Aqui e ali, lagoas sazonais –tive a sorte de pegar muitas ainda cheias e até nadar nelas– que são como traiçoeiros espelhos a nos iludir inocentemente com o convite para mergulhar no pedaço do azul que refletem. E aí tem o próprio céu que, emprestando de Paul Bowles, não só nos protege como nos inspira a seguir procurando onde ele acaba no horizonte.

Porque tudo que podemos fazer ali é andar, marcar minimamente nossa presença, pois, num exemplo de preservação, essa paisagem segue prístina, cobrando silenciosamente do visitante não apenas respeito como vigilância. O melhor que podemos fazer para agradecer tal visão é deixá-la intacta. Por isso caminhamos na areia na certeza de que o vento logo vence e apaga nossas pegadas.

E eu segui andando pelos Lençóis Maranhenses um dia inteiro. Há quem faça passeios de dois, três dias ou mais. Não tinha tempo para isso –e logo conclui que isso nem seria necessário para mim já que eu tinha ao meu redor a prova de que, como um hábil jogador de pôquer que nem precisa abrir as cartas que recebe para subir sua aposta, eu estava certo.

Vou seguir sugerindo Lençóis como destino prioritário para meus amigos. A diferença é que já não estou mais blefando. Agora sou testemunha de que lá mora a beleza.


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