Folha de S. Paulo


Passar o Natal no Marrocos pode render surpresas inesperadas

Guilherme Tosetto/Folhapress
Barracas de comida montadas na praça Djemaa El Fna, em Marrakech, no Marrocos
Barracas de comida montadas na praça Djemaa El Fna, em Marrakech, no Marrocos

Já viajou com alguém que faz aniversário no dia 25 de dezembro? É curioso como uma coincidência dessas –ter nascido no mesmo dia que Jesus, que é lembrado nessa data quase no mundo todo– pode distrair nossa atenção para o feriado. Ainda mais em Marrakech!

Alguns Natais atrás eu estava com um grupo de amigos naquela que é a cidade mais conhecida do Marrocos, para celebrar o aniversário da filha de uma amiga, que completava 18 anos justamente naquele 25 de dezembro.

Não que o próprio Natal estivesse passando em branco. Nos souks da medina (traduzindo: os mercados do centro murado da cidade, cheios de lojinhas e vendedores de todo o tipo de mercadoria), compramos presentes para o amigo secreto que faríamos.

E não tinha como não lembrar dos Reis Magos ao subir num daqueles camelos marroquinos, especialmente em Brigitte, a "camela" favorita na nossa turma. Estávamos sempre nos divertindo com a inusitada situação de passar esses dias de festa no meio de uma cultura que não tem por hábito celebrá-la.

Os dias corriam rápido diante de tantas coisas que nossos olhos queriam registrar. Perder mais cinco minutos pechinchando numa loja de tapetes ou ver o pôr do sol entre palmeiras e dunas? Uma massagem restaurativa com óleos perfumados ou mais um kebab na brasa de um vendedor ambulante? Breves dilemas que Marrakech nos propunha a cada novo dia.

Na noite do dia 24, tivemos um dos jantares mais maravilhosos da minha vida. Num espaço exclusivo do tradicional hotel La Mamounia (então recém-reaberto depois de uma luxuosa reforma), dividimos um banquete com uma comportada família francesa, que certamente se arrependeu de ter compartilhado o salão com um animado grupo de brasileiros que não apenas falavam alto e cantavam, como também –"quelle horreur!"– dançavam ao som daquela hipnótica música ao vivo.

Assim, tínhamos dado por encerradas as atividades natalinas e nos concentramos então na escolha de um lugar para celebrarmos aqueles 18 anos. Queríamos que fosse um jantar típico, mas de certa forma autêntico. Não apenas uma "arapuca para turistas".

Decidimos ir ao Comptoir Darna, tradicional casa de comidas típicas, com um espetáculo de danças orientais e uma atmosfera, pensamos, que nos tiraria completamente do clima de Natal: exatamente o que queríamos naquele momento para celebrar o aniversário.

Segundos depois de sentarmos à mesa, ela já estava repleta de "mezzes", as comidas mais deliciosas que podíamos imaginar.

As pessoas iam chegando e a música ia subindo, até o momento máximo, quando então começou o silêncio. O burburinho dos convivas foi diminuindo: o grande espetáculo estava para acontecer. Foi nessa hora então que desceu pelas escadarias do salão um Papai Noel carregado numa bandeja. E depois outro e outros!

Um pouco confusos, tentávamos dar sentido àquela visão inesperada, que ficou ainda mais absurda quando, debaixo daquela fantasia vermelha e branca (e das barbas!), surgiu um time de bailarinas de dança do ventre! Foi o delírio...

Contorcendo-se, primeiro sobre as bandejas, depois pelas mesas –inclusive a nossa!– elas encheram aquela noite de alegria, sensualidade e mistério. O sagrado, especificamente naquele Natal, deu lugar ao profano. E nossa amiga teve um aniversários dos mais inesquecíveis. E das arábias.


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