Folha de S. Paulo


Hora de cortar juros, sem dó nem medo

Alan Marques/Folhapress
Presidente do BC, Ilan Goldfajn, comanda a reunião do Copom
O presidente do BC, Ilan Goldfajn, comanda reunião do Copom

O juro real "básico" no mercado está para ficar abaixo de 5%. Estava em 7,2% em outubro. Foi quando o Banco Central deu um chega para lá no "mercado", dizendo então que o juro "básico do BC" (Selic) cairia mais devagarzinho.

Outra vez, o "mercado" está mais animado com a baixa dos juros do que o Banco Central.

O que aconteceria se o BC cortasse hoje a Selic em um ponto, de 12,25% para 11,25%? Nada. Nada de ruim. É o que os negociadores de dinheiro grosso e seus porta-vozes estão dizendo, pelos preços da feira do mercado.

Consultorias razoáveis e bancos maiores estão prevendo inflação abaixo da meta de 4,5% em 2017 e na meta em 2018. Mesmo com a Selic caindo para 8,5% ao final deste ano e assim ficando até o final de 2018.

Entre maio e novembro, a inflação deve ficar abaixo de 4%. Dois terços das negociações coletivas de salário, algumas das maiores, acontecem nesse período. Na média das últimas negociações computadas pelo Dieese, os reajustes dos acordos perderam da inflação.

A taxa de desemprego ainda deve aumentar. Com inflação passada e esperada menor, além de desemprego alto, apenas em uma hipótese histérica os salários pressionariam a inflação em 2018.

A não ser que o Banco Central esteja prevendo um crescimento econômico de, digamos, uns 7% até o final do ano que vem, não há muito como defender o ritmo atual de corte da Selic. É ironia, claro.

O BC tem dito que pedras podem cair pelo caminho. A reforma da Previdência pode tropeçar, cair ou até morrer. No entanto, não é fácil dizer que isso implica taxa de juro maior.

Sem reforma, é bem possível que se desfaçam as esperanças de retomada econômica tão cedo. Que risco e as taxas de juros de longo prazo subam, matando no berço intenções de investimento. O problema fiscal (deficit e dívidas crescentes do governo) não tenderia a piorar de imediato, menos ainda provocar por si descontrole inflacionário.

O país cairia numa leseira pelo menos até 2018. Haveria uma sarneyzação. A equipe econômica de Michel Temer ou de um tampão alternativo fariam o "arroz com feijão"a fim de evitar um estouro operístico das contas públicas. Seria uma hipótese "no-no-no", sem crescimento, sem inflação, sem nada.

Sim, pode haver pânico, porém. Derrotado no que interessa, um Temer apenas tampão ficaria mais sujeito à cassação pelo TSE. Mesmo que permanecesse, como um dois de paus, a sucessão de 2018 seria imediatamente antecipada.

A crise social ampliada pela falta imediata de expectativa de melhora poderia causar tumultos. Pelo menos, tornaria mais provável a eleição de maluquices em 2018.

Nessa hipótese, há alguma fuga de capital, desvalorização do dólar, asfixia de empresas, paralisia de qualquer plano restante de investir, picos de alta de juros.

Nesse caso, pode haver um repique inflacionário —na verdade, coisas piores. Mas, nesse caso, não teria adiantado nadica de nada o BC ter jogado na retranca —no tumulto, poderia dar um choque de juros de emergência.

O time teria sido expulso, o estádio teria ficado no escuro ou a torcida teria invadido o campo, a metáfora futebolística que se queira para definir o fim de jogo confuso.


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