Folha de S. Paulo


O andar da carruagem encalhada

Jorge Araujo/Folhapress
SAO PAULO SP Brasil 05 07 2016 No Km 17 da rodovia Anhanguera pátio da montadora Hyundai tomada de veiculos.no ABC Volks com carros espalhados no interior da montadora, no espaço ao lado da Ford Caminhões Mercedes e cegonheiras que carregam veiculos MERCADO Jorge Araujo Folhapress 703 ORG XMIT: XX
Carros em pátio de montadora no Estado de SP

AS EXPECTATIVAS para a economia brasileira em 2017 foram muito reduzidas e são agora menos que modestas. Em vez de dúvidas sobre crescimento, discutimos se ficaremos à tona, se não vamos encolher outra vez. A despiora continua, contudo, apesar de lenta e trôpega.

Nesta quarta (4), soubemos que a venda de veículos caiu pouco mais de 20% em 2016, ante 2015, dados da Fenabrave, associação nacional dos revendedores. É horrível, mas já foi pior. Entre março e julho do ano recém-acabado, a queda andava em torno de 29%, em termos anuais (vendas acumuladas em 12 meses).

No ritmo recente de despiora, as vendas parariam de cair, ano a ano, lá por setembro. Na estimativa da Fenabrave, 2017 fecha com 2,4% de alta nas vendas, anualmente no vermelho desde setembro de 2013.

Ainda não saíram os dados da produção de veículos de 2016, que andavam um tico melhores pelo menos até novembro. A baixa anual na produção de veículos deve ter ficado ainda na casa de 13%. De novo, é horrível, mas já foi pior. Entre março e agosto, a produção caía ao ritmo de 25% ao ano. Outra vez, despiora.

A fabricação e a venda de veículos foram uma frustração terrível em 2016. No início do ano, a associação das montadoras, a Anfavea, previa aumento de 0,5% na produção e queda de "apenas" 7,5% nas vendas. Em junho, reviu os números para queda de 5,7% na produção e 19% nas vendas. Ainda estavam otimistas, como se vê.

O desastre fica mais evidente quando se lembra que a indústria tem capacidade de fabricar 5 milhões de veículos por ano (carros, comerciais, caminhões, ônibus etc.). A utilização ideal dessa capacidade é de 85%, 4,25 milhões, diz a indústria. Está fabricando metade disso, cerca de 2,1 milhões.

Diante de uma baixa de 20% nas vendas e, provavelmente, de 13% na produção, de onde viria o impulso para pelo menos zerar o jogo, deixar de cair? Taxas de juros menores, pessimismo menor dos consumidores, pelo menos estagnação na massa de rendimentos do trabalho.

Não parece animador, são estímulos pequenos.

Os primeiros sinais de dezembro, de indicadores indiretos, apontam que o mês foi meio frustrante. Seja lá como tenha sido, a temperatura do inferno em que a indústria nacional queima parece
vir diminuindo um pouco.

O nível de utilização da capacidade instalada (UCI) da indústria descera ao quinto dos infernos em janeiro do ano passado, para 72,4%, o pior desde que a FGV começou a fazer sua medição, em 2001. Subiu a 76,3% em dezembro de 2016, mesmo nível de dezembro de 2015.

Para quem não está acostumado a essas medidas, o UCI variava neste século de 76%, nas recessões, a 86%, nos superaquecimentos econômicos. Algo em torno de 81% parece um número razoável. Pois então: baixamos a 72%, como se disse mais acima, e voltamos agora a 76%, fundo das recessões menos estrambóticas e horrendas.

Em meio a esta desgraça, é algum alento. O temor de novos tombos permanece. No entanto, repita-se, vamos ter menos inflação comendo os salários, taxas de juros menores e, caso a política não desgrace tudo de novo, talvez menos pessimismo em meados do ano.

Não é grande coisa, mas pode ser o fim de uma sangria de três anos.


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