Folha de S. Paulo


A economia de Trump

Jeff Kowalsky/AFP
US Republican presidential candidate Donald Trump exits his final rally of the GOP 2016 presidential campaign at Devos Place in Grand Rapids, Michigan on November 7, 2016. / AFP PHOTO / JEFF KOWALSKY ORG XMIT: JAK124
O novo presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump

Donald Trump e coerência pragmática ou programática são palavras que não andam bem juntas. Como pensar o que será feito da economia americana?

Quando se tenta deduzir um projeto do que se disse em sua campanha, chega-se a alguns republicanismos estereotipados, para não mencionar os apêndices também politicamente inviáveis ou tumultuários.

Nos governos Ronald Reagan e George Bush a dívida pública subiu devido à fórmula republicana típica de baixar impostos, para ricos em particular, e gastar mais em defesa.

O candidato republicano também propôs redução radical de impostos sobre empresas, além de uma simplificação tributária extensa. A alíquota máxima do imposto sobre a renda também cairia. O IR ficaria mais parecido com o do Brasil, que privilegia mais ricos. Mas o rolo econômico nem está aí.

Trump quer aumentar gastos em infraestrutura, "em obras", o que implicaria um aumento de deficit, o que é até programa dos democratas de esquerda. Mas quer, ressalte-se, baixar impostos. Quer aumentar gasto em defesa. Rejeita cortes na Previdência Social e na maioria dos gastos em saúde. Chegou a mencionar de passagem apoio a aumento de salário mínimo pelos Estados.

No ritmo desembestado dos números de campanha, isso daria em crescimento ainda mais rápido do deficit.

O Escritório de Orçamento do Congresso previa aumento contínuo da dívida mesmo antes de Trump, por causa de Previdência, saúde de idosos e juros mais altos. O deficit passaria dos atuais 2,5% do PIB (incluindo a conta de juros) para 3,3% do PIB, ano final de Trump 1.

A sabedoria convencional diz que isso resulta em crescimento ainda mais rápido das taxas de juros. No entanto, a discussão do programa Trump por ora carece de fundamento maior: planos, números e alianças políticas.

Trump não juntou uma equipe de pensadores econômicos, acadêmicos, pelo menos. Empresários bilionários, vários ligados ao setor imobiliário-financeiro, são o seu conselho até agora.

Como se sabe, o presidente eleito não tem relação organizada com a máquina do Partido Republicano, menos ainda com a maioria dos caciques. Terá de lidar com bancada de deputados que, além de não gostar de deficit, tem poder e inclinação para cortar asas de presidentes.

Entre outros problemas, a arenga trompista contra o comércio exterior não agrada a grandes empresas que vivem de salário barato chinês ou mexicanos, para ficar apenas no exemplo caricato, mas muito real. Expulsar imigrantes irregulares, cerca de 5% da mão de obra, obviamente vai causar tumulto social e econômico. Em 2020, tem outra eleição, parlamentar.

A vitória decerto agrega, traz aliados, talvez amenize os populismos mais odientos. Porém, Trump prometeu satisfação de ressentimentos e empregos ao mundão médio americano. Como?

O que sairá disso?

O homem nem tem experiência alguma na administração ou no poder públicos. É uma incógnita como vai conviver com o restante do establishment, com o poder formal e informal, em particular Wall Street, que por exemplo abduziu a imaginação e a política econômicas dos democratas Bill Clinton e Barack Obama. Por ora, Trump é incerteza. O que em si mesmo já não é bom.


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