Folha de S. Paulo


'Vai ter luta' na saúde e muito mais

Alan Marques/Folhapress
Brasilia, DF, brasil 06.10.2016 manifestante e expulso da votacao da PEC do Teto Foto:Alan Marques/Folhapress cod 0619
Manifestante foi expulso durante votação da PEC do Teto na Câmara

O gasto com saúde é o primeiro campo das batalhas que serão causadas pela aprovação do "teto" para as despesas federais. O próximo, que deve ser muito mais amplo e intenso, será o da Previdência. Outros virão.

A disputa vai se expandir para outros cantos do Orçamento. Vai envolver os interessados em serviços públicos de saúde e educação, tanto os mais ricos quanto os mais pobres. Vai envolver empresas beneficiárias de subsídios e reduções de impostos. Funcionários públicos. Beneficiários da Previdência e do seguro-desemprego.

Caso a emenda constitucional que limita os gasto federais seja aprovada tal como passou em primeiro turno na Câmara, haverá disputa por uma quantidade fixa de dinheiro, como agora o povo começa a perceber. Fixa por pelo menos uma década, caso os próximos governo e Congresso não decidam derrubar o "teto" —tudo é possível.

Por enquanto, grita-se contra a perspectiva de que a verba mínima para a saúde não vá crescer tal como o previsto na norma atual. Se a verba mínima permanecer a mesma, deve cair cerca de 5%, em termos per capita, até 2026, data prevista para a primeira revisão do "teto". Desde o início do século até 2015, crescera cerca de 30% (per capita).

Caso o "teto" passe mesmo a vigorar, em breve os defensores dos recursos para a saúde, dentro e fora do governo, procurarão dinheiro noutra parte do Orçamento. Onde?

Uma opção serão as desonerações de impostos e subsídios, dinheiro que as empresas deixam de recolher por concessão do governo. Na prática, um gasto que pode ser cancelado e transferido para outra rubrica –saúde, educação, Previdência, investimento.

Também "na prática", o cancelamento desses gastos tributários equivaleria a um aumento de impostos, do ponto de vista das empresas. As "desonerações" da Previdência nos anos Dilma Rousseff são um desses gastos gordos.

Por falar nisso, o gasto com Previdência, mesmo com reforma, ainda vai crescer bem por vários anos, achatando alguma outra despesa. De despesas maiores, sobram as aposentadorias e salários dos servidores federais e os investimentos "em obras". "Vai ter luta", como dizem certos militantes da política.

Note-se de passagem que o governo gasta diretamente cerca de 1,7% do PIB em saúde. Gasta indiretamente, digamos, outro 0,5% do PIB em saúde por deixar de recolher impostos, renúncias fiscais do setor.

Essa estimativa é dos pesquisadores Carlos Ocké-Reis (Ipea) e Filipe da Gama (Receita Federal), calculada na Nota Técnica 19 do Ipea, para dados de 2013.

Entenda-se. Pessoas físicas e jurídicas podem abater despesas de saúde no Imposto de Renda. Há reduções de impostos ("desonerações") para a indústria farmacêutica e para hospitais filantrópicos. Isso é gasto indireto em saúde. Como tantos subsídios, será objeto de "luta".

Caso se aprove de vez o "teto", a caça aos dinheiros do Orçamento será mais intensa. Haverá disputa do bolo de tamanho fixo, a ser dividido por mais gente, pois a população cresce.

A alternativa será a "flexibilização" do teto, acompanhada de aumento de imposto, ou a privatização de certos serviços públicos. Será um debate da eleição de 2018. Será um conflito aberto em 2022, no mais tardar.


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