Folha de S. Paulo


Elites temem governo mambembe

Ainda é difícil saber o que tem de verdade nesses convites e desconvites para o virtual ministério Temer, típico de conversas sobre a formação de ministérios de qualquer governo. A fofoca fica mais rumorosa em caso de quem assume mandatos pescados em águas turvas e de duração incerta.

De mais certo é que vários ministeriáveis com reputação intelectual ou política a zelar temem tomar o caminho de um governo que ora parece tão seguro quanto a passarela de bicicletas que desgraçadamente desabou e matou nesse Rio infelicitado pelo PMDB.

Abre parênteses: o show de horror desclassificado da política tem uma participação muito especial do PMDB do Rio. Quebraram o Estado. De lá saíram Eduardo Cunha, Sérgio Cabral, os Picciani, o cafajeste que batia na mulher, amiguinho de Eduardo Paes, a grande esperança branca do PMDB. Fecha parênteses.

Essa elite dos "ministeriáveis" teme a desmoralização pessoal em um governo mambembe. Tem medo de razias das hordas de hunos do Congresso.

Pessoas respeitáveis e preocupadas de fato com o governo do país temem passar por um processo de "joaquinização". Isto é, serem solapadas, desautorizadas e fritas como Joaquim Levy, ministro da Fazenda do primeiro ano de Dilma 2.

Duvidam da falta de apoio, de legitimidade e das convicções do governo. O PMDB aderiu à "causa liberal" faz apenas seis meses, quando pisou na "Ponte para o Futuro". Trata-se do plano de reformas lançado por Temer em outubro passado, um programa da campanha que o vice começara em agosto.

Esses "ministeriáveis" temem as contas a pagar que o governo terá no Congresso: com Cunha, caciquetes do "centrinho" e caciques do PMDB que ficaram com Dilma Rousseff (de Renan Calheiros a Jader Barbalho).

Imaginam que o apoio dessa gente possa custar a desidratação das "reformas". Sabe-se lá o que vai acontecer, mas essa é uma ansiedade desses "ministeriáveis". Trata-se da mesma preocupação de parte pesada da elite econômica, em particular daquela que nunca viu graça no impeachment. Os maiores banqueiros do país pensam mais ou menos assim.

Quanto à "joaquinização", ninguém usa esse nome inventado pelo jornalista. Mas a memória da desmoralização de Levy está fresca.

O ministro assumiu com um programa amplo, que ia de ajuste fiscal a abertura comercial, passando por reforma tributária etc., citando palavras grandes como "fim do patrimonialismo", citação errada, aliás, mas não vem agora ao caso.

Logo, Dilma Rousseff podou a árvore de Levy quase à morte, deixando um galho fraco de ajuste e um ramo seco de reforma tributária. O PT fritou o ministro sem parar. Em abril, ele já era tostado por seus colegas de ministério.

Em maio, Levy perdeu uma refrega sobre corte de gastos. Em julho, engoliu o fim do superavit primário, na prática. Em agosto, passou o vexame terminal de ser obrigado a mandar para o Congresso um Orçamento com previsão de deficit. Em setembro, o crédito do país seria oficialmente rebaixado. Levy também. Daí em diante, seria rolado rampa abaixo por Dilma e Planalto.

Um destino similar ao de Levy, a ruína econômica e a sujeira política assombram o diminuto establishment mais esclarecido.


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